sexta-feira, 20 de junho de 2014

Piedade



Onde reside o direito? Como o trabalhador comum pode almejar melhorias de trabalho e remuneração? Bom, não existem, na legislação brasileira atual, muitas formas de protesto de funcionários contra patrões. O problema maior é que, sendo o Brasil parte do globalizado mundo capitalista, estamos regidos pelo famoso ditado “Manda quem pode, obedece quem tem juízo!”.
Mais ainda, segundo as principais teorias do Capitalismo, o mercado deve manter um bom contingente de trabalhadores desempregados. Isso para poder sempre ter uma ameaça pairando sobre os trabalhadores empregados, com quem diz: “Se você não quer, tem quem queira!”
Assim, não restam, aos trabalhadores, muitas ferramentas para conseguir melhorias em salários e condições de trabalho. A mais simples dessas ferramentas é buscar o auxílio da Justiça Trabalhista. Mas, apesar de mais simples, não é a mais eficaz. Isso porque, nem todas as reivindicações são motivadas por descumprimento da lei. Boa parte dos movimentos são motivados para melhorar condições de trabalho que, apesar de legais, são imorais ou insuficientes para o trabalho desenvolvido.
Dessa maneira, mesmo que o trabalhador busque a Justiça, nem sempre vai poder ter a sua reivindicação atendida, simplesmente porque a Justiça não contempla aquele pedido.
Além disso, mesmo que o trabalhador tenha o direito e que possa buscar efetivamente a Justiça, um grande problema ainda desestimula essa procura pela justiça, a perseguição pelo trabalhador que processa o patrão.
Ainda que seja proibido por lei, muitos trabalhadores deixam de buscar a Justiça por medo de não serem contratados por outras empresas, de não conseguirem um outro emprego. Para fugir à Justiça, as empresas que recusam um trabalhador alegam variados motivos para negar emprego, mas muitas vezes, o motivo real é a ação judicial que o trabalhador move contra sua antiga empresa. Esse preconceito acaba por fazer com que o trabalhador deixe de buscar os seus direitos.
Dessa maneira, a forma que sobra para os trabalhadores buscarem os seus direitos é através de manifestações de greve. A greve paralisa as atividades da empresa, prejudica o patrão e força a tomada de alguma atitude. Além disso, é uma forma legal de manifestação, prevista no art. 9º da Constituição Federal de 1988.
Contudo, o direito de greve tem sido bastante negado aos trabalhadores. Isso porque a Justiça Brasileira tem, cada vez mais, olhado para e pelos patrões e menos pelos empregados. É cada vez mais comum a Justiça decretar como ilegais as várias greves que se espalham pelo país.
Esse assunto é importante diante das últimas notícias de greves no transporte público brasileiro. A maioria, se não todas, foram declaradas ilegais pela Justiça. A greve dos motoristas de ônibus de Cuiabá foi uma das declaradas ilegais, apesar de manter parte dos carros operando.
Claro que greves em serviços que atinjam a sociedade são complicadas, por acabam prejudicando outras pessoas que não tem qualquer culpa pelo problema. Mas ao mesmo tempo, é importante que cada um ajude seu próximo, até porque, quem sabe quando você vai precisar do próximo, certo?
No caso de Cuiabá, em especial, a paralisação do transporte público prejudica muito as pessoas que tem de ir pra escola ou para o trabalho. Mas se o Governo tivesse cumprido o prometido e entregado o VLT dentro do prazo, as coisas seriam mais fáceis. Além disso, é muito fácil simplesmente jogar a culpa nos trabalhadores grevistas. Mas é bem mais difícil se por no lugar deles. Boa parte das pessoas que criticam os movimentos de greve, se estivessem no lugar dos trabalhadores, também fariam parte da paralisação.
A mídia também não colabora, com os jornais mostrando apenas os problemas que a greve causa, mas sem mostrar o que motivou o movimento.
É de causar tristeza saber, contudo, que mesmo com toda a comoção causada, ainda assim poucas dessas reivindicações serão atendidas. Isso porque não interessa ao patrão a melhoria da qualidade de vida do trabalhador, pois isso encarece os custos e diminui os lucros. E quem se importa com um trabalhador infeliz, se temos milhões desempregados que aceitam qualquer tipo de humilhação apenas para ter um salário, ainda que ínfimo, no final do mês.
Mas pior de tudo mesmo são os casos em que o patrão não tem nem a coragem de conversar diretamente com o trabalhador. O patrão tem que ser, pelo menos, homem o suficiente para dizer aos seus empregados o que pensa e o que vai fazer. Mandar recados por assessores de RH ou de porta-vozes, como boa parte dos donos de empresas faz, é mesquinhez, mediocridade e covardia.
Nas palavras de Cazuza, “Vamos pedir piedade, pra essa gente careta e covarde! Vamos pedir piedade: ‘Senhor, piedade. Dê-lhes grandeza e um pouco de coragem!’”.

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