Originalmente
publicado no Jornal “O Diário”, Edição nº 1.751, em 15/08/2013.
Uma
das funções dos profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros e técnicos de
enfermagem, é assistir as pessoas doentes e que precisem de cuidados médicos.
Isso é simples, certo?
Só
tem um problema: o verbo assistir tem vários significados. Assistir no sentido
de ver, presenciar (vg.: eu assisti
ao filme); pode ser caber, competir (vg.:
ao autor assiste o direito) e também ajudar, acompanhar. Depois das
notícias que surgiram na última semana, acho que se esqueceram de avisar que o
assistir da área da saúde era o assistir de ajudar, não o de presenciar, de ser
um mero espectador nessa platéia dos horrores.
Pelo
menos é o que parece quando vemos uma menina de 16 anos, grávida, que deu à luz
ao filho nas escadas de uma maternidade em São Luis do Maranhão, sob os olhares
atentos de funcionários da maternidade, que assistiram (só no sentido de ver,
infelizmente) imóveis e apáticos à tudo.
Enquanto
isso, apenas 938 médicos formados no Brasil se inscreveram no Programa Mais
Médicos. Isso atende cerca 6% apenas da demanda de médicos no país. Comodoro
foi uma das cidades premiadas, vai receber 2 médicos, mais do que qualquer
outro município mato-grossense.
Mas
enquanto esses dois profissionais não chegam, a população sofre. E não estou
falando de São Luis do Maranhão. Domingo passado, uma mãe levou um filho com quase
40 graus de febre ao nosso hospital e saiu de lá, duas horas mais tarde, sem
que a criança tenha sido atendida, ou assistida, por um médico.
Com
tudo isso acontecendo, os Conselhos de Medicina e órgãos médicos em geral e
mesmo a classe, criticam abertamente o Programa Mais Médicos, dizendo que
brasileiros que vão para a Bolívia para cursar medicina não tem formação
suficiente para trabalhar no Brasil. Só que duas coisinhas destroem esse
raciocínio. Primeiro, apenas 194 dos 715 profissionais formados no exterior que
se inscreveram no Mais Médicos são brasileiros formados fora do país. Os outros
521 inscritos são estrangeiros que se formaram no seu país e tem a intenção de
ajudar o país.
Segundo,
considerando a qualidade de algumas Universidades brasileiras, se todos os
profissionais formados no país fossem submetidos a um exame nos moldes do
Revalida, muito poucos seriam aprovados, à exemplo do que acontece com o Exame
da OAB.
Claro
que não podemos achar que simplesmente contratar mais médicos vai resolver a
situação. É importante que aja estrutura para trabalho, equipamentos,
medicamentos. E, mais importante ainda, somente a contratação de mais médicos
não resolve o problema; são necessários também os demais profissionais da
saúde, como enfermeiros, técnicos de enfermagem, farmacêuticos, etc.
Mas,
como dizia meu finado avô, mais vale um pássaro na mão do que dois voando. Ou
seja, enquanto usufruímos de mais médicos, brigamos pelas outras coisas. Agora,
o que não podemos aceitar é que os médicos, por interesse financeiro e por
status, prefiram cobrar pequenas fortunas para assistir (no sentido de ajudar)
apenas os mais afortunados, enquanto nossa população mais carente assiste
(apenas no sentido de ver) a tudo impassível.
No final, se não tomarmos alguma atitude, partos
em escadarias e crianças voltando para casa sem atendimento deixará de nos
indignar para ser apenas mais um fato corriqueiro do dia a dia. Vai acabar
sendo mais útil procurar parteiras e curandeiros do que ir num hospital. Sei
não, mas acho que não era bem isso que Hipócrates tinha em mente quando
idealizou o juramento feito por médicos ao se formarem.
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