“Ninguém respeita a Constituição, Mas
todos acreditam no futuro da nação.” Assim fala a letra da música Que País é Esse?, da banda Legião
Urbana, composta em 1978. O verso me ocorre agora porque na semana passada, foi
comemorado o aniversário de 25 anos da Constituição Federal Brasileira,
conhecida como Constituição Cidadã. Considerada um marco da redemocratização
brasileira, a Constituição foi a oitava Constituição Brasileira e a sétima
Constituição da República.
Porém, a CF/88 foi a primeira a
trazer, em seu bojo, instruções sobre praticamente todos os aspectos da
sociedade brasileira, desde os direitos e garantias mais fundamentais até a
organização e funcionalidade dos tribunais superiores.
Por comparação, a CF/88 é considerada
uma das mais extensas do mundo, com 250 artigos, 74 Emendas Constitucionais,
mais um adendo, chamado Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com
95 artigos, cujo objetivo era regulamentar, temporariamente,
a legislação até que fossem editadas leis ordinárias sobre esses assuntos, ou a
própria CF/88 fosse alterada, o que estava previsto para acontecer cinco anos
após a promulgação da Constituição.
Apenas para ilustrar, a Constituição
Americana, escrita logo após a independência dos Estados Unidos, em 1787, tem 7
artigos e 27 emendas.
Entretanto, o que mais chama a atenção
na CF/88são os direitos assegurados ao cidadão. Em sua maioria, os direitos
estão dispostos no art. 5º (direitos e garantias individuais) e 7º (direitos
sociais). Originada no final da ditadura militar, a CF/88 é muito voltada para
garantir ao cidadão os direitos que lhe foram negados pelo regime ditatorial.
Nos artigos citados, que por sinal
fazem parte de um rol de artigos que jamais poderão ser alterados, as chamadas
cláusulas pétreas, estabelecem desde direitos básicos como saúde, educação e
segurança, até questões mais processuais do direito, como a individualização e
a forma de cumprimento de penas condenatórias.
Dessa forma, é consenso que a CF/88 é
muito mais do que apenas uma legitimação do Estado Brasileiro ou um conjunto de
regras aleatórias para definição de Estado e Nação. A CF/88é, acima de tudo,
uma carta de direitos do cidadão brasileiro, cujo objetivo principal é
proteger-nos da opressão e da tirania.
Porém, apesar de ser,
reconhecidamente, uma Constituição defensora do cidadão, é importante que
frisemos duas questões. A primeira é: Quanto da Constituição Federal está sendo
realmente cumprido? Quais os direitos ali previstos estão sendo respeitados?
A resposta à essas perguntas acaba por
ser simples: quase nada! Direitos simples como educação, saúde e segurança
acabam por desaparecer no emaranhado dos interesses políticos, da corrupção e
dos jogos de interesse. Alguns exemplos nos mostram isso: o acordo para o
chamado orçamento impositivo, pelo qual foi aprovado que as emendas ao
orçamento feitas por deputados, as verbas que os deputados federais destinam
para suas regiões, agora não poderá mais ser vetado pela Presidenta.
O Governo tentou fazer com que, pelo
menos 30% desses valores fossem destinados à educação, mas quem disse que os
deputados aceitaram?! Agora, cada deputado conta com cerca de 10 milhões de
reais por ano para aplicarem onde bem entenderem.
Mais que isso, essa semana o comitê da
FIFA para a Copa do Mundo esteve em Cuiabá, acompanhando o andamento das obras.
É assustador saber o quanto está sendo gasto com obras para receber míseros
três jogos da Copa do Mundo, enquanto o Governo do Estado não é capaz de
atender as reivindicações dos professores, categoria que por sinal ainda estão
em greve.
Outra questão a ser debatida sobre a
CF/88 é a relação entre o contexto em que ela foi escrita e a atual conjuntura
social brasileira.
Vinte e cinco anos atrás, o Brasil
saía de uma ditadura militar de vinte anos. O então Presidente Tancredo Neves,
ao que consta nos anais da história, mesmo gravemente doente, recusou-se à ser
internado temendo que sua internação pudesse desencadear um novo golpe de
estado por parte dos militares. A simples exposição de ideias contrárias ao
regime militar era motivo para prisões com trabalhos forçados, tortura e
assassinatos.
Claramente, a realidade social
brasileira necessitava de uma Constituição Federal que eminentemente protegesse
tanto o cidadão quanto o estado democrático de direito. Uma vez ultrapassado o
processo de redemocratização do Brasil, seria sensato uma revisão da lei
constitucional, conforme foi previsto pelo Presidente da Constituinte, Ulysses
Guimarães, no art. 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Entretanto, passados vinte e cinco
anos, pouca coisa realmente mudou. A ditadura acabou, mas esperada reforma
política jamais aconteceu. O sistema presidencial e o voto secreto e universal
são uma realidade, o temor de um golpe militar praticamente não existe. Mesmo
assim, a CF/88 permanece inalterada em sua essência.
Diferente de 1994, quando foi
realizada a revisão constitucional, dessa vez o motivo de não haver alterações é
puramente pelo comodismo e pela falta de vontade dos nossos gestores em sair da
sua zona de conforto e melhorar o país.
Enquanto isso, a Constituição Cidadã,
junto com a maioria dos cidadãos, fica cada vez mais jogada à mercê dos
interesses e das vontades de uns poucos. Afinal de contas, que país é esse?
Nenhum comentário:
Postar um comentário