sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Mordaça

"o que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons"

Essa semana foi finalizada uma consulta pública que o Congresso Nacional fez, via internet, sobre o Projeto de Lei 122, que trata da criminalização de atitudes discriminatórias contra homossexuais, deficientes físicos e idosos.
Aparentemente, a questão dos idosos e dos deficientes é pacífica. Entretanto, o que causa discussão no Congresso é a questão dos homossexuais. Principalmente por parte da bancada evangélica. Chegaram até mesmo à chamar o projeto de “Mordaça Gay”! Incrível.
Não me causa muita estranheza o conservadorismo e a falta de tolerância por parte dos evangélicos. Boa parte dos políticos que integram essa parte da sociedade são bastante radicais. O que me assusta são os dados obtidos durante a consulta pública.
É preciso dizer que a Lei não impede ninguém de expressar suas opiniões ou outra coisa do gênero. Apenas torna crime a discriminação dos “diferentes”. Se você não gosta de gays, tudo bem, mas se você impedi-lo de entrar na loja em que você trabalha apenas pelo fato de ser gay, é discriminação. Isso não é cerceamento de opiniões ou algum tipo de “mordaça”. É respeito! Pelo próximo e por si mesmo, afinal, seguindo o ditado: “Respeitar para ser respeitado!”
Agora, quando eu fui votar eu fiquei realmente surpreso com o resultado parcial: o não estava ganhando! Quer dizer, o povo brasileiro não aprovava uma lei que obrigaria as pessoas a fazer algo que já deveria ser feito por vontade própria, uma lei que obrigue as pessoas a respeitarem seus semelhantes. Isso realmente me espantou.
Sinceramente, não sei o que pode ter causado esse tipo de atitude no povo brasileiro. Claro que o expressivo aumento no número de evangélicos no Brasil pode ter contribuído, mas não explica. O mais lógico (assim espero!) é q falta de informação. Eu mesmo descobri a consulta por acaso, quando visitei o site da Câmara dos Deputados por outros motivos. Assim, o povo brasileiro passaria de preconceituoso à mal informado. Não sei o que é pior, de verdade!
Agora, pior do que a falta de informação do povo brasileiro, ou pelo menos a falta de engajamento social, é forma como o “outro lado”, a bancada evangélica, tratou o assunto. Enquanto chamavam a Lei de “Mordaça Gay”, eles criavam uma “Mordaça preconceituosa e hipócrita”. Afinal, se qualquer um chama um evangélico de “crente”, eles ficam bastante irritados. Se você começar a fazer piadas com as roupas que eles obrigam suas mulheres à vestir ou com os cortes de cabelos (ou falta de corte) delas, eles se sentem muito ofendidos.
Então porque eles aceitam que outras pessoas sejam ofendidas e fiquem quietas? Porque impedir que pessoas que se sintam ofendidas por comentários ou ações preconceituosas busquem justiça? É claro que o preconceito arraigado tem sua parcela de influência, mas a meu ver, o grande motivo disso é a hipocrisia! Os evangélicos não querem que os gays tenham direito à justiça porque são os primeiros a insultá-los e discriminá-los. Então como fariam seus gritantes sermões se pudessem ir para a cadeia por isso?
Mas é importante que não tratemos com o mesmo preconceito que eles dispensam aos outros. Quando falo em evangélicos preconceituosos e hipócritas, me refiro à alguns. Outros, por outro lado, são pessoas amáveis e responsáveis, que não vêem problema algum na lei ou em qualquer outro instrumento criado para dar segurança jurídica aos homossexuais pelo simples fato de que eles não irão sofrer os rigores dessa lei, por que, gostando ou não de homossexuais, eles os respeitam, não por sua orientação sexual, sua raça ou seu credo, mas pela sua condição de ser humano.
É com base nesses exemplos que espero que o mundo caminhe. Só para ilustrar que existem pessoas que, mesmo levando com rigor suas convicções, não deixam de lado o respeito e a dignidade, basta dizer que, no inicio deste ano, o estado americano de Utah, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (nome oficial da Igreja Mórmon) declarou apoio à uma lei semelhante à brasileira, que impedia uma série de abusos que vinham acontecendo, tais como os homossexuais serem despejados de suas casas ou demitidos apenas em virtude de sua opção sexual.
Vale lembrar que a Igreja Mórmon é uma das mais radicais que existe e foi alvo de várias críticas no mesmo estado de Utah por ser radicalmente contra o casamento gay. O líder Mórmon justificou o apoio dizendo que não concorda com o homossexualismo, mas respeita os gays pela sua condição de homens livres.
Dessa forma, acho que fica claro que não importam suas convicções ou suas escolhas, desde que você respeite à todos. Isso é o primeiro passo para termos uma sociedade justa e evoluída. Vamos torcer para que isso aconteça ainda!
Só para finalizar, informo que o resultado não-oficial da consulta pública foi a de que o "sim" ganhou, mas por pouco. O resultado oficial deve sair na semana que vem.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

CARTA ABERTA À SOCIEDADE

Esta Carta Aberta é uma resposta da sociedade organizada às críticas proferidas contra a UNEMAT pelo "fiasco do concurso". Entretanto, é dever salientar que a UNEMAT é mais do que apenas uma realizadora de concursos, é uma promotora de futuros, de perspectivas, de sonhos.
Não se deve criticar toda a instituição pelo erro de uns poucos, poucos esses que, infelizmente, dirigem a Universidade de forma ditatorial, anti-democrática e eleitoreira. Sei que isto é um chavão, mas os que me conhecem de longa data saberão que estou certo em dizer: "Eu avisei!"
Para os que me conhecem à menos tempo, explico: à cerca de sete anos, quando o sr. Taisir Karin se candidatou pela primeira vez à Reitoria da UNEMAT, eu já previra o que iria acontecer, má administração, gestão fraudulenta e politiqueira. E informava ainda que tais afirmações não eram vazias nem fruto de preconceito. Eram baseadas na desastrosa gestão do Instituto de Linguagem durante seu mandato.
Desde então a UNEMAT vem passando por processo de sucateamento, vem sendo leiloada à políticos para seus objetivos mais egoísticos, até mesmo pelo próprio movimento acadêmico. Coisas pelas quais lutamos arduamente foram trocadas por ninharias e favores pessoais. Haja vista o fim do voto paritário!
Mas saibam que há resistência! Alguns servidores, tanto professores quanto técnicos, ainda que sem expressão política, desempenham um trabalho magnífico, vencendo as dificuldades e os obstáculos colocados pela má gestão e administração.
Assim, deixo aqui a esperança e o apelo à todos: Salvemos a UNEMAT dos políticos e dos aproveitadores! Vamos torná-la uma Universidade soberana, livre e autônoma novamente!

A UNEMAT É DO POVO MATO-GROSSENSE

Estamos todos perplexos diante do escândalo que se tornou o maior concurso público da história do país. Perplexos e indignados com a forma como a UNEMAT vem sendo tratada tanto pelo Governo do Estado quanto pela Reitoria. O concurso reflete o grau de irresponsabilidade dos agentes públicos no comando tanto do Governo quanto da Universidade. Mas, não reflete a sociedade mato-grossense, nem a comunidade da UNEMAT. A UNEMAT não é um problema. É uma instituição que tem oferecido, a milhares de jovens do interior, a oportunidade de acesso ao ensino superior público. São 15 mil alunos para quase mil professores e 450 técnicos, aproximadamente. Desde os anos 80, a UNEMAT tem sido a grande responsável pela formação de professores no estado, contribuindo para que Mato Grosso tivesse hoje a quase totalidade de professores graduados na rede pública. Por esforço de seu quadro docente, conta com quatro programas de mestrado institucional e inúmeros outros em parceria com renomadas instituições de ensino superior do Brasil.

Além disso, a UNEMAT como instituição multi-campi, está presente em todas as regiões do Estado do Mato Grosso e, potencialmente, tem todas as condições de produzir conhecimento que atenda questões de relevância social.

Apesar disso, a média de gasto por aluno é de cerca de R$ 700,00/ano (setecentos reais por ano), enquanto a média das universidades públicas brasileiras gira em torno de R$ 8.000,00/ano (oito mil reais por ano)! De fato, não é surpresa que as condições estruturais da UNEMAT não sejam adequadas. E não o são por duas razões: Primeiro porque o governo tem tratado a nossa universidade com descaso. É somente quando há risco de desgaste político ao governo que a UNEMAT se torna pauta da agenda governamental ou quando há interesses de atender clientelas políticas, oferecendo cursos sem planejamento e sem garantia de financiamento.

Há tempos que a comunidade acadêmica, através das entidades representativas de professores e estudantes tem denunciado às autoridades a forma temerária, irresponsável como vem sendo gerida a Universidade. Tantas são as denúncias feitas sobre o caráter nefasto que, por exemplo, a FAESP tem adquirido no interior da UNEMAT. Os desrespeitos constantes da reitoria às decisões de instâncias superiores, a forma atabalhoada como tem sido conduzidas questões importantes como a própria implementação do Plano de Carreira dos Professores, as denúncias de corrupção, tudo isso são provas mais que suficientes da incapacidade da direção da UNEMAT de conduzir um concurso público da magnitude deste que pretendeu fazer. O governo foi avisado, reiteradas vezes. Mas, preferiu ignorar os fatos, preferiu acreditar na tese de que não tem responsabilidade sobre os desmandos e desorganização interna da UNEMAT. Preferiu acordos com a reitoria para projetos eleitorais. Pagou caro por isso!

Nós, que somos parte da comunidade da UNEMAT, não de sua direção, representantes da sociedade organizada, não vamos aceitar que a responsabilidade sobre o vexame do concurso recaia sobre a Universidade. A responsabilidade é de quem, com o poder e dever de governar para todos, tratou a universidade como um “incômodo problema” e, sem políticas para o setor de ensino superior, preferiu “lavar as mãos”.

Não aceitamos que a comunidade acadêmica inteira seja julgada a partir das práticas clientelistas e irresponsáveis de sua direção, práticas estas que temos combatido diuturnamente no interior da Universidade e fora dela.

O fiasco do concurso público não depõe contra a universidade, revela sim a insustentabilidade de uma gestão incompetente, sem direção e autoritária que, por isso mesmo, conduziu o concurso da mesma forma como vem conduzindo a universidade. Exigimos que os entes públicos (Executivo, Legislativo, Judiciário) assumam a responsabilidade sobre esta instituição que é pública: exigindo cumprimento das regras institucionais, respeito decisões dos colegiados superiores, enfim, às leis que regem toda e qualquer administração pública que a direção da UNEMAT parece desconhecer!

Não admitimos mais uma Universidade amordaçada! A UNEMAT é de todos nós mato-grossenses, exigimos respeito!!

ADUNEMAT, DCE PAULO FREIRE (UNEMAT, Cáceres), DCE EDSON LUIS (UNEMAT, Sinop), SINTEP, CUT/MT, MCCE Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral, OAB/MT, DCE UFMT, ADUFMAT, ANDES-SN Regional Pantanal,

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Uma Vitória pela Maioria

Chegamos ao final de mais uma campanha. Dessa vez, uma campanha para ocupar o cargo máximo da advocacia estadual, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Mato Grosso. Quem sagrou-se vencedor foi o Dr. Cláudio Stábile, tendo como vice o Dr. Maurício Aude.
É imprescindível neste momento salientarmos que foi a vitória da ética, da dignidade e da verdade. A vitória de uma campanha limpa e honesta, que nada mais visou que não a apresentação de propostas e que pretendeu, desde o início, apenas apresentar sua plataforma, sem recorrer aos barbarismos que sempre vimos em quaisquer campanhas eleitorais. E é preciso também destacar a elegância e a dignidade da chapa vencedora ante as várias acusações proferidas pela outra chapa, sem recorrer à respostas grosseiras ou respondendo acusações com outras acusações. Em todos os momentos, o Dr. Stábile, os demais componentes da chapa e seus apoiadores foram altivos, respondendo insultos com propostas, e apenas respondendo às acusações que lhes cabiam, afim de deixar claro sua idoneidade e comprometimento com a classe.
Confesso que estava entusiasmado e, porque não dizer, levemente assustado com o andamento da campanha, em seu princípio. No começo, as duas chapas eram claras e objetivas, tratando-se com cordialidade e simpatia. Nas palavras de uma colega: “Eles (os candidatos Dr. Stábile e Dr. Scaravelli) mais pareciam dois amigos com opiniões divergentes!” E, durante uma boa parte da campanha, esse foi o clima, de cordialidade e amistosidade, senão de amizade.
Entretanto, aparentemente quando percebeu que suas chances de vencer caiam drasticamente, o Dr. João Vicente Scaravelli mudou a postura de sua campanha, partindo para agressões e acusações, o mais das vezes sem fundamento algum, semelhante às mais baixas campanhas eleitorais vistas Brasil afora.
Não obstante, em nenhum momento o Dr. Stábile mudou o tom de seu discurso, preferindo, muito acertadamente aliás, apresentar propostas do que ficar rebatendo acusações infundadas.
Outro diferencial da campanha do Dr. Stábile foi a forma abrangente como foi desenvolvida, buscando votos em todas as camadas da militância advocatícia mato-grossense, sem fazer distinção entre antigos ou novos, homens ou mulheres, sem qualquer preconceito.
Em verdade, a Chapa “Pela Valorização do Advogado” fez um trabalho excelente, não se focando apenas nos advogados mais influentes e conhecidos. Com visitas aos escritórios menores, localizados nos bairros mais afastados, e também aos colegas interioranos, o Dr. Stábile mostrou que de fato se importa com todo e qualquer advogado.
Outra bandeira levantada pela Chapa 01, e que foi magistralmente desenvolvida pelo Dr. Stábile e seus apoiadores foi a do jovem advogado, uma parte da classe normalmente excluída e marginalizada, mas que foi inserida de forma ativa na campanha, tendo, até mesmo logo e adesivos personalizados, mostrando a importância que esses profissionais têm perante a classe.
Outro setor da advocacia que sempre fora negligenciado e que a Chapa 01 fez questão de inserir em sua campanha foram as mulheres. Contando com o apoio da maioria das colegas advogadas e com ações, propostas e eventos especificamente voltadas para a mulher advogada, o Dr. Stábile deixou claro que as mulheres, apesar de subvalorizadas e mal remuneradas, são parte essencial da advocacia, não só de Mato Grosso, mas de todo Brasil.
Com ações arrojadas, sem qualquer tipo de preconceito ou demonstração de inferioridade em importância de um ou outro, a Chapa “Pela Valorização do Advogado” provou que a campanha e sua futura administração será tão inclusiva e tão intransigente nas defesas das prerrogativas de todos os advogados quanto eram suas propostas.
Assim, creio que toda a classe pode se sentir segura e protegida, pois seu representante-mor recém-eleito continuará o bom trabalho que há tempos vem sendo desempenhado, sem por em sobressalto o coração da advocacia mato-grossense.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

É isso aí

Luis Fernando Veríssimo escreveu uma vez que a morte salva o artista de si mesmo. O salva do ridículo ao que o próprio artista se expõe, ao tentar fazer brilhar uma estrela que há muito já se apagara.
Veríssimo cita como exemplo, Elvis Presley. Pouco antes de morrer, Elvis tinha virado uma paródia de si mesmo, usando roupas ridículas e tentando reaver um esplendor à muito perdido. Com sua morte, entretanto, Elvis voltou a ser o Rei do Rock, um artista lendário.
Tomadas as devidas proporções, o filme “Michael Jackson’s This is It” faz mais ou menos a mesma coisa, quer dizer, reabilita um artista à beira do fracasso total, através da sua morte.
Ao se propor a fazer 50 shows em tão curto espaço de tempo, Michael Jackson parecia querer retomar o sucesso à tanto perdido, alem, é claro que tentar salvar suas finanças, que estavam em um estado caótico.
Com a imagem abalada por seguidos escândalos Jackson aparentemente tentava, com esta turnê, anunciada como a última que faria, restabelecer o brilho que tivera outrora. Sua morte, entretanto, frustrou seus planos.
Tentando dar ao astro a chance de brilhar uma última vez e também, por que não dizer, tentando diminuir as perdas avassaladoras que a morte de Jackson causou para a produção da turnê, o diretor do show Kenny Ortega, fez um filme que tem tudo para se transformar numa lenda: os últimos dias de um Rei!
A grande sacada do filme não é sua fotografia, seu roteiro ou qualquer outra característica técnica. Na verdade, como foi feito a partir de gravações do make in off dos ensaios para os últimos shows, a qualidade da película é ruim. Entretanto, a idéia não parece ser montar um filme com alta qualidade, mas sim mostrar ao mundo uma faceta de Michael Jackson, ou MJ, que o público não conhecia.
E nesse aspecto, “This is It” é um espetáculo. Sobre a direção de Kenny Ortega, o filme mostra um Jackson tímido, de fala mansa, mas determinado e perfeccionista, mostrando apenas seu lado profissional e deixando totalmente de lado os assuntos pessoais do astro. “This is It” não é um filme sobre Michael Jackson. É um filme sobre o ultimo show de um astro.
Apesar de, obviamente, Michael Jackson ser o centro das atenções, Ortega não se concentrou apenas nele, mostrando, de uma forma ou de outra, todos aqueles que compunham o show e gravitavam em torno de MJ. Assim, quem assiste ao filme pode perceber que, apesar de toda a fama de egocêntrico, mau humorado e chato, Jackson era uma pessoa doce, amável e gentil, só discutindo quando alguém tentava fazer mudanças com a sua música.
Essa é outra característica bem retratada na filme: o profissionalismo de Michael. Sempre atento aos mínimos detalhes do show, ele não parecia se importar quantas vezes tivessem que refazer as coreografias, quer por erro próprio, quer por erro dos bailarinos. Também não tinha qualquer necessidade de ofuscar seus companheiros de palco, numa clara demonstração de sabia que tinha seu espaço e era hora de dar espaço também aos outros.
Enfim, seu único interesse era de que o show ficasse perfeito. Isso claramente demonstra que, ao menos para MJ, o interesse no show era mais do que dinheiro.
Vendo o filme, podemos perceber que quaisquer que fossem os defeitos e os problemas pessoais de Michael Jackson, seu talento estava acima de qualquer suspeita e que o sucesso do filme não é mais do que justo. Uma estrela ofuscada que conseguiu retomar seu brilho com um filme sobre seu último trabalho antes de morrer. Afinal, uma boa decisão profissional.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Amigos Públicos

(Publicado originalmente no jornal Folha do Estado de 14/08/2009)

Inimigos Públicos chama a atenção antes de mais nada por causa do elenco. Johnny Depp, Christian Bale e Marion Cotillard juntos são uma promessa e tanto.

O problema é a história. Baseada na vida do gângster John Dillinger, que existiu de verdade, mas que não tem o mesmo apelo de outros grandes vilões da história criminosa americana. Apesar disso, o roteiro é bem escrito.

Centrado essencialmente na personalidade e na vida de Dillinger, o filme mostra mais do que crimes, violência e assaltos à bancos. Na pele do típico bandido bonzinho, Depp demonstra novamente uma habilidade impar para interpretar personagens complexos.

Mesmo com uma história aparentemente fraca, o diretor Michael Mann faz um grande filme, não só pela magnífica atuação de Depp e companhia, mas também pela produção caprichada e bem elaborada. As cenas de tiroteio e de perseguição automobilísticas são de um realismo impressionante.

Maestralmente, Mann conseguiu unir ação e drama num mesmo longa. Alternando ações de intensa movimentação como de assaltos à bancos com cenas mais sentimentais, tais como a cena do jantar ao som de blues ou jazz em que Dillinger conhece Billie, a personagem de Marion Cotillard, o diretor faz do filme algo sui generis difícil de classificar. Dramático demais para um filme de ação e movimentado demais para um drama. Talvez por isso mesmo, um filme maravilhoso, sem o maniqueísmo que vem imperando no cinema americano desde 11 de setembro.

Apesar de ter um papel coadjuvante, Bale se mostra maturidade e sagacidade na telona, ao interpretar o investigador Melvin Purvis, do FBI (apesar do termo não ser citado uma única vez no filme todo). Mostrado como um Maquiavel da Policia americana, sempre sério, para quem os fins justificariam os meios, Bale não perde a linha nem banaliza a violência, deixando claro apenas pela interpretação que não concorda, conquanto aceita, os métodos que ele mesmo emprega, mas sem se corromper nem deixar que isso saia dos limites.

Marion Cottilard também demonstra uma desenvoltura maravilhosa, provando (se é que isso ainda era necessário) que “Piaf” não foi um acaso ou um golpe de sorte. De fato, AM determinados momentos, ela se sobressai à Depp, demonstrando que não se assusta com nomes consagrados ou com super-produções. De personalidade forte, Billie é o “amor da vida” de Dilliger e por isso mesmo a razão de muitas de suas ações, algumas das quais tolas e insensatas. Alguém com menor força que a própria Billie não conseguiria interpretá-la, mas Mann com certeza não se decepcionou com Marion.

Depp, como sempre, alias, estava magnífico. Deixando de lado personagens excêntricas, como o incomum capitão Jack Sparrow de “Piratas do Caribe”, ele interpreta John Dillinger não como um ator, mas como um verdadeiro gangster. De atuação impecável, sem ter que recorrer à falas extensas ou diálogos redundantes, Depp é capaz de expressar os sentimentos da personagens com sorrisos de canto de boca e olhares enviesados. Em algumas cenas, não são precisas mais do que meia dúzia de palavras ditas, apenas as expressões faciais dos atores são suficientes.

Com um roteiro de falas exatas, sem exageros e sem excessos, com uma fotografia impecável e com um recurso bastante criativo, que é o de explorar de forma mais acentuada seus astros, deixando poucas cenas nas mãos dos coadjuvantes, para que pudesse extrair deles o melhor possível, Mann parece ter construído um filme maravilhoso. Talvez não o suficiente para se tornar um épico ou concorrer à grandes premiações, pois a historia não é lá essas coisas. Mas, com certeza, você não se decepciona quando sai da sala de cinema.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Leitores...

Texto oublicado originalmente na homepage do Sinducato dos Policiais Civis e Agentes Prisionais - SIAGESPOC - em 12/08/2009
É interessante ver algumas bobagens que saem por ai, em nossos Tribunais Superiores. Pra quem não sabe, já a algum tempo, existe um entendimento de que estrangeiros cumprindo pena no Brasil, principalmente em regiões fronteiriças (como a nossa) e, mais principalmente ainda, nos casos de crime de tráfico de drogas, cujo processo de expulsão já estivesse em andamento, não teriam direito ao benefício da progressão de regime.
Isso ia muito bem, sem nenhum solavanco, nenhum entrave. Tanto os juízes de primeira instância quanto o Tribunal de Justiça do estado entendiam isso como normal e aceitável. Mesmo nossos tribunais superiores, o STJ e o STF também se mantinham coesos com esse entendimento.
É claro que todos os advogados do mundo, como é prerrogativa de sua função e dever de sua profissão, iriam protestar contra isso, recorrendo até as últimas instâncias possíveis, tentando de todas as formas reverter esse quadro. Mas se fossem honestos com seus clientes, deveriam dizer claramente:
– Cara, não vai dar! Você não vai sair.
Fundamental é explicar o que motivou tal decisão de denegar a progressão de regime para estrangeiros é o elevado número de fugas empreendido por bolivianos. Apesar de a Lei de Execução Penal ser bastante clara ao determinar que o reeducando que cumpre pena em regime semi-aberto deve fazê-lo em colônia agrícola ou industrial, isso não ocorre, devido à uma falta de estabelecimentos dessa natureza. O que ocorre, na prática, é que o sujeito é posto em liberdade, tendo, em alguns casos, que comparecer diariamente, na porta de alguma unidade prisional para assinar um livro ponto.
No caso especifico de Cáceres, de onde emanou o pedido de progressão de regime, esse livro ponto fica na Cadeia Feminina, onde os Agentes Prisionais ficam sozinhos e desarmados, totalmente expostos à qualquer ameaça. Para quem não sabe, recentemente, numa tentativa de resgate, morreu um Policial Militar na Unidade.
Voltando ao tema em pauta, diante da total falta de estrutura do estado, fica extremamente difícil realizar um controle rígido dos reeducandos que cumprem pena no regime semi-aberto. Diante dessa situação periclitante, para evitar uma clara sensação de impunidade que vinha já acontecendo, os magistrados (muito acertadamente na minha opinião) estavam denegando os pedidos de progressão de regime para presos, se houvesse suspeita fundada de possibilidade de fuga, v.g. se o mesmo fosse natural de alguma cidade vizinha à fronteira, como San Mathias ou Santa Cruz ou se tivesse residência comprovada em pais fronteiriço.
Mas, como sempre no Brasil, sempre que algo funciona bem, tem alguém que estraga a festa. Nesse caso, nosso ilustre Ministro Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso. Não discuto o conhecimento jurídico do magistrado. Apenas que é um tanto quanto difícil pra alguém que vive encastelado em seu gabinete em Brasília saber como é o mundo de verdade....
Dessa vez, o que aconteceu foi que o Ministro, desconsiderando tudo que vinha sendo entendido até agora, e depois de praticamente já votado e decidido o pedido de Habeas Corpus, pediu vista do processo e votou a favor da concessão da progressão. Outros dois ministros, o senhor Eros Grau e o senhor Joaquim Barbosa (isso, aquele mesmo da discussão com o Gilmar Mendes) também mudaram seu voto, concedendo a liberdade.
Segundo o senhor Peluso, a negativa da progressão descumpria preceito constitucional de igualdade, ou seja, de que todos são iguais perante a lei. Bom, pra quem não sabe, não foi só pelo fato de que a reeducanda não é brasileira que foi negada seu pedido, mas por não cumprir os requisitos para a concessão do benefício.
Outra alegação do ministro é a de que, ao negar a ordem, tanto o juiz de primeira instância quanto o Tribunal justificaram a denegação da ordem em virtude da peticionária não possuir residência fixa. Entretanto, essa alegação não procede, segundo ele, porque, senão, como iríamos lidar com casos de moradores de ruas, que também não tem residência fixa?
São duas as respostas que se apresentam para esse enigma: primeiro, de acordo com o Código de Processo Penal, residência fixa é um dos requisitos para soltura, ou seja, se a pessoa não puder comprovar residência, ela não sai. Por isso, moradores de rua não tem direito à progressão se não puderem comprovar um endereço. Segundo e talvez mais importante, um morador de rua não tem residência fixa nem aqui no Brasil nem em parte alguma. Já um boliviano preso por tráfico de drogas tem moradia. Só que outro país! E é pra lá que ele vai assim que sair da cadeia, rindo da justiça brasileira.
Como um professor da faculdade me disse uma vez, ler a lei é fácil, qualquer um faz. Aplicar a lei, adequando-a ao caso concreto e avaliando as questões sócio-culturais envolvidas, isso sim é uma arte e um ofício. Já disse antes e repito, não discuto o conhecimento jurídico do ministro Peluso. Mas, definitivamente, dessa vez, ele agiu como um mero leitor de leis e não um jurista.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Mais do Mesmo

Mais uma vez andei freqüentando ambientes culturais. Dessa vez foi o show da dupla Chitãozinho & Xororó. Tudo bem, reconheço que parece estranho, algo piegas, freqüentar um evento desses. Mas, como dizia meu avô, o que é do gosto é regalo da vida. Somente, devo informar que não tô falando do meu gosto. Estou falando do gosto da Paula. Foi ela quem me arrastou para aquele show.
Só que pra chegar ao show foi uma verdadeira tragédia! São Pedro não poderia ter escolhido um outro dia pra fazer tanto frio? Somos mato-grossenses, ora! Não importa o quanto reclamemos do calor, não fomos feitos para passar frio. Fazia muito tempo que não via minha respiração se condensar na minha frente, fazer aquela fumacinha.
Mas devo dizer que as coisas negativas param por aí. Depois que já tínhamos enfrentado o frio cortante pra chegar ao Centro de Eventos, concluí que não tinha perdido minha viagem. O show foi ótimo. Num revival da era de outro do sertanejo, a dupla cantou as musicas mais antigas, as famosas modas de viola. E também, sem perder uma das características que fizeram o sucesso da dupla, eles tiraram do fundo do baú algumas guarânias paraguaias.
A dupla parece ter, enfim acertado a mão. Depois de algumas tentativas frustradas de mudanças, Chitãozinho e Xororó acabaram por decidir que era melhor mesmo se manter nas musicas que fizeram o sucesso da dupla no passado. As novidades até existem, mas bem tímidas e sempre seguindo a linha daquilo que já deu certo antes.
Essa táctica se mostrou bastante acertada, considerando que quase todos os expectadores acompanhavam os dois na cantoria. Desde o princípio do show, o que se via era uma platéia animada, participativa e que, principalmente, acompanhava todas as canções. Isso, pelo menos pra mim, é prova de que o show agradava.
Uma das minhas maiores dúvidas era se a dupla ia cantar um dos seus atuais sucessos, “Sinônimo”. E se cantasse, quem faria às vezes do Zé Ramalho. Parecia meio absurdo que o próprio Zé viesse até Cuiabá pra cantar só uma música. Havia, lógico, o risco claro de se nomear um representante de Zé Ramalho, afinal, dificilmente encontraríamos alguém minimamente tão competente quanto ele. Mas minhas dúvidas foram sanadas cedo. Sim, eles cantaram a música. E mais surpreendente, acompanhados pelo próprio Zé. Devidamente projetado, do dvd, numa tela ao lado do palco. Se a dupla propriamente dita cantou em playback eu não sei. Mas se cantou, foi a única musica assim. As outras foram, claramente, cantadas ao vivo.
Fora a dupla propriamente dita, o resto da banda também é muito boa. Um violonista solo que não deixa nada a dever aos guitarristas de qualquer banda de rock. Um cara que tocava acordeom que podia tocar em qualquer festa junina do nordeste. Um violinista, tomado da Família Lima que era um show à parte. Na verdade, acabei descobrindo nessa sexta que o casamento da Sandy com o Lucas Lima foi por interesse:
– Toma a Sandy pra vocês e me dá aqui um violinista bom! – teria dito o Xororó.
No final, como todas as duplas antigas, é claro que os dois quiseram mostrar que também podem ser “modernos”. Inventaram uma batida misturada de sertanejo com hip hop e depois com uma mixagem que eu, pessoalmente, achei muito ruim. Mas como todo mundo já tava em paz consigo mesmo e com o mundo, além de já ter aproveitado muito o show, ninguém ligou muito.
Pra encerrar, ao som da musica-tema do extinto especial Amigos, a banda reunida do centro do palco, numa despedida linda e emocionante. Enfim, um show em que valeu a pena pagar o ingresso e enfrentar o inusitado frio cuiabano!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Divagações sobre Harry Potter (Parte III)

Tem gente que já deve estar de saco cheio, mas as minhas divagações sobre a pré-estréia do sexto filme do Harry Potter estão terminando.
Como já disse, nunca fui um grande apreciador dos filmes do Harry Potter. Por um motivo principal: a adaptação é péssima! É verdade que quase nunca uma adaptação de livro fica boa na telona. São casos raros. Tão raros que agora não me ocorre nenhum!
Desde muito tempo atrás, a adaptação dos livros para o cinema é complexa e cheia de defeitos. Os produtores alegam falta de tempo e recursos. Dizem que para um filme ficar minimamente parecido com o livro, eles precisariam de um épico com varias horas de duração. O argumento tem fundamento, mas não convence completamente. Isso porque tirar alguns elementos do livro por economia de tempo é aceitável, mas introduzir conceitos e situações que modificam a idéia original do autor é um pouco de exagero.
Mas os filmes do HP são um caso à parte. Sinceramente, espero que a J.K. esteja ganhando uma bolada e tenha um saco de paciência pra deixar fazerem isso com a sua obra.
Tenho a impressão de que os produtores e diretores não leram os livros com metade do interesse de um fã, ou não cometeriam as aberrações que cometeram em todos os filmes até agora rodados. Desde o primeiro da série, até o quinto, todos eles tinham uma apresentação sofrível e completamente desconectada da obra original. Os dizeres que aparecem nos créditos “baseado na obra de J.K. Rowling” deveriam ser alterados para “levemente semelhantes a algumas poucas coisas da obra de J.K. Rowling”.
Mas o sexto filme se supera. Desde trechos que são importantes do livro completamente obliterados do filme até mudanças cruciais de comportamento das personagens, quase tudo é modificado.
Claro que não podemos ser irascíveis. Algumas mudanças são aceitáveis e até mesmo necessárias para que o filme se desenrole e tenha cenas de maior movimento. Mas a forma com as mudanças foram feitas.
Na verdade, o filme me parece mais uma forma de como não fazer uma adaptação de obra literária. Mudar o comportamento psicológico das personagens nunca dá um bom efeito, principalmente porque corre-se o risco de perder a sua identidade. E numa seqüência longa como Harry Potter, isso pode ter conseqüências, no mínimo, desagradáveis.
Transformar Harry Potter e o Enigma do Príncipe num melodrama de romance adolescente, como foi feito é demonstração de incapacidade de produção, é apelação, do tipo “já que não vamos fazer um filme bom de verdade, mudamos tudo pra tirar a atenção da nossa incompetência!”
O mistério do Príncipe Mestiço que dá nome ao livro e ao filme é citado superficialmente, en passant, como se não tivesse nenhuma importância. Outra grande falha é o fato de que no livro o período em que este passa é cheio de desaparecimentos, de situações perturbadoras, o cria um clima de mistério e suspense. Já no filme, Voldemort nem sequer aparece, salvo em lembranças de sua juventude. Não há o mesmo medo se infiltrando pelas frestas da janela como no livro.
E por falar nas lembranças juvenis de Tom Riddle, esta é outra grande falha do filme. No livro, Harry e Dumbledore avançam juntos, de lembrança em lembrança, reconstituindo toda a vida de Voldemort. Quase toda a sua vida é explorada e investigada e tanto Harry quanto o leitor passam a compreender alguns dos motivos que levaram Tom Riddle a ser tornar o mais maléfico bruxo que já existiu.
Já no filme, novamente, isso fica de lado, sendo só um item coadjuvante da história. Duas miseras lembranças são mostradas, ainda por cima incompletas. Novamente, muda-se o perfil psicológico do personagem. Voldemort é visto como um garoto arredio e sem atrativos, conquanto no livro é descrito como um jovem que chama atenção para si, tentando fazer com que todos o notem. Além disso, é charmoso e sedutor quando precisa. No filme, todos esses aspectos são deixados de lado, bem como outras lembranças, que serão imprescindíveis para as tarefas que aguardam nosso herói no sétimo livro. Coitado de Harry do filme, ele tem um trabalho muito mais difícil do que seu congênere do literário.
Com todas essas elipses da história, com tudo o que foi tirado, você deve estar se perguntando o que afinal o filme mostrou. Bom mostrou um bando de adolescentes, com os hormônios em fúria, flertando praticamente o tempo todo, tentando acertar suas vidas amorosas. Voldemort não é tão importante quanto Harry beijar a Gina! Até mesmo uma cena foi introduzida no filme, sem nenhuma correspondência com o livro, creio que apenas para demonstrar o amor de Ginevra por Harry: o ataque dos Comensais da Morte à casa dos Wesley.
Até mesmo Dumbledore deu uma de alcoviteiro, elogiando a garçonete que Harry cantou (ele fez isso?) numa pequena lanchonete ou perguntando, cheio de segundas intenções, qual o relacionamento entre Harry e Hermione.
Algumas mudanças mais objetivas também não surtiram um bom efeito, pelo menos naqueles que já leram os livros. Por exemplo, o fato de Comensais da Morte poderem voar e se transformar em fumaça. O que pouca gente entendeu é que, entre o lançamento do livro e o lançamento do filme, alguns Comensais da Morte ficaram treinando, acabaram evoluindo e se transformaram super Comensais-Sayajins nível 3!
De forma geral, o desenvolvimento do filme é sofrível, o que me faz ter medo do que vão fazer nas duas partes em que transformaram o sétimo livro. No sexto, recriaram a história como um High School Musical Mágico, com um dramalhão romancesco adolescente no lugar de uma aventura que poderia ser magicamente épica!

Divagações sobre Harry Potter (Parte II)

Continuamos nossas divagações sobre a pré-estréia do Harry Potter e o Enigma do Príncipe. Como eu disse antes, a fila era descomunal. Mas uma coisa que pude notar naquele monte de gente era que a média de idade era bem baixa. Praticamente todo mundo ali era adolescente. Eu tava quase perguntando onde era a fila preferencial para idosos.
A média dos que esperavam na fila era tão adolescente que chegou a extremos de uma menina que estava logo atrás de mim dizer que o tumulto todo era causado porque “lá na frente só tem moleque!”. Olhando para o rosto frágil e delicado da menina que falou aquilo, não resisti e perguntei quantos anos ela tinha.
– dezessete – ela respondeu
Na mesma hora a amiga dela, que também não parecia ter muito mais idade, respondeu:
– Tá vendo! Quase uma criança e falando dos outros.
De novo não me contive e perguntei a sua idade também: vinte.
Não que isso seja um problema. O problema é só o surto hormo-potteriano que tomou conta da sala de cinema depois do começo do filme. Cada vez que entrava em cena algum ator mais ou menos bonito era a deixa pra histeria, gritaria, palavras de amor. Triste, triste.
Agora, o pior de tudo era que, pelo menos do pessoal que estava na mesma sala que eu, as pessoas pareciam levar as coisas do filme pro lado pessoal. Como se qualquer ato maléfico cometido contra seus personagens favoritos fosse cometido contra o próprio expectador.
E a tão esperada cena do beijo do Harry Potter? Parecia que o mundo ia desabar na minha cabeça. A barulheira que fez, de gritos, uns de apreço, outros de raiva, e alguns só pra fazer barulho junto. Nunca vi, ou melhor, ouvi uma coisa assim, a não ser em jogos de futebol.
De qualquer forma, apesar de certo constrangimento, afinal de contas, sou um homem adulto, assistindo um filme na madruga, cercado por adolescentes com os hormônios à flor da pele, acho que tinha o direito de estar lá. Até porque, quando eu comecei a ler as aventuras do bruxo mais famoso da atualidade, a maioria dos meus colegas de cinema nem mesmo sabia ler.

Divagações sobre Harry Potter (Parte I)

Ontem fui assistir à pré-estréia do filme Harry Potter e o Enigma do Príncipe, o sexto da série. Tanto por curiosidade mórbida, quanto por insistência da minha namorada. Não gosto nem nunca gostei muito dos filmes do HP. Afinal sou um leitor ávido dos livros da série e as adaptações para o cinema são muito ruins. Mas afinal de contas, me disseram que este seria melhor, que haveria mais proximidade com a história do livro, esse tipo de propaganda, na qual eu, ingenuamente, acreditei. A adaptação foi horrível de novo. Mas falo sobre isso depois.
Primeiro eu quero falar sobre a odisséia de HP 6. Não em virtude do tempo e do desgaste das gravações, que afinal foram também uma odisséia, nem do fato óbvio de que a série é épica. Mas da odisséia de enfrentar a fila para entrar no cinema. Nunca havia visto uma fila daquele tamanho para um filme.
Mas afinal a pré-estréia de Harry Potter e o Enigma do Príncipe era um evento ansiosamente esperado. Tudo bem que estou confuso com esse negócio de pré-estréia até agora. Afinal de contas, a estréia não é justamente o lançamento do filme? Então o que haveria de ser a pré-estréia? Seria um grupo de fãs ardorosos assistindo solenemente a chegada das películas ao cinema? Pois ontem descobri que não. A pré-estréia é afinal a estréia do filme. Só mudam o nome pra não desanimar os trouxas que não tem coragem, paciência ou saco pra enfrentar uma fila gigantesca pra assistir um filme no meio da madrugada.
Voltando à fila. Como eu disse, jamais tinha visto uma fila daquele tamanho para um filme. E olha que eu já filas grandes. Uma vez cheguei em uma fila às quatro da manhã, para uma entrega de senhas que começaria apenas às oito. E ainda por cima, recebi a senha 152, o que prova o grande interesse das pessoas naquela fila. A diferença? A fila era para a inscrição no sorteio de casas populares do governo estadual. Ou seja, algo um tiquinho mais importante do que um filme.
Mesmo assim, desconsiderando qualquer conceito que fazia de fila, dirigi-me aquela coisa descomunal, como um homem que vai à forca. Cheguei, pasmem, às oito horas da noite, para um filme que começaria só à meia-noite e um. Claro que não fui tão cedo com a intenção de criar raízes no saguão do cinema enquanto esperava um filme que eu nem estava tão ansioso assim pra assistir. Na verdade, eu queria aproveitar e fazer umas compras, comer alguma coisa, fazer uma hora. Duas horas pra falar a verdade, se levarmos em consideração que as lojas fechariam as dez.
Mas, seguindo os pedidos, quer dizer, as exigências da Paula, fomos lá ver se já tinha algum doido na fila. Para minha surpresa e, por que não dizer, certa indignação, não só tinha fila como uma fila já consideravelmente grande. Absurdo. Segundo a atendente da bomboniére, tinha gente desde sete e pouco na fila. O filme começaria só á meia-noite! Inacreditável.
Mais inacreditável que a própria fila, só a quantidade de gente que tentava furar a fila. É incrível a falta de respeito e educação que as pessoas têm. Poxa, tinha gente há horas naquele lugar, inclusive eu, mesmo a contragosto. Porque outros espertinhos tinham que se dar melhor? Até mesmo uma conhecida minha, graduanda em Direito, fez furou a fila.
Mas quem tentou se dar bem não teve muita sorte. Fora um ou dois que conseguiram sem maiores problemas, a maioria acabou por passar vergonha. Quando tentava passar na frente de alguém era imediatamente rechaçado e tinha de sair da fila sob vaias de todos. Se eu disse que a fila tava grande, imagina ser vaiado por todos...
A parte boa de uma fila desse tamanho é que você acaba fazendo amigos, conhecendo pessoas, descobrindo afinidades. Numa espera de tanto tempo como foi ontem, não tem jeito de ficar impassível. Normalmente começa com um simples pedido para ir ao banheiro e segurar o seu lugar. Ou então com a revolta com as indignidades cometidas contra os partícipes da fila. Não demora muito, a conversa já fica quase íntima. Se brincar, estão trocando confidências. No caso de ontem então, com um monte potters-fãs juntos, não havia quem não fosse amigo do seu companheiro de fila.
Por fim, depois de quase quatro horas de espera e tortura (“nunca mais vou numa pré-estréia” é a frase mais ouvida na noite!) conseguimos entrar na sala. Mas não se engane, nossa epopéia está só no começo. Ainda tem mais.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

China

Em todo lugar do mundo tem massacres e combates entre policia e cidadãos. Até no Brasil de vez em quando tem disso, se bem que não muitos, já que o brasileiro não protesta muito mesmo. Mas em nenhum lugar do mundo tem tanto disso quanto na China.
O país que tem a maior população do mundo também tem o maior número de combates entre a China do Governo e a China do povo. E quanto povo! Quando já estamos esquecendo uma pancadaria, lá vem outra.
Tudo bem que o país é grande e multiétnico. Mas daí a estar sempre batalhando, já é um pouco de exagero. Em qualquer lugar civilizado existem lá os seus conflitos, mas normalmente é uma coisa mais tranqüila, mas pacífica. Os policiais fazem contenção e os manifestantes ficam lá gritando e esbravejando seja contra o que eles esbravejam. Sem porrada, sem violência. Em países subdesenvolvidos a história normalmente é outra. A policia baixa o cacete mesmo, desse a porrada. As vezes apanha, mas em geral bate mais. Dá uns tiros com bala de borracha e joga umas granadas de efeito moral, essas coisas. Mas o negócio é só pancadaria. Quando alguém morre, o bicho pega de verdade. Imprensa, igreja, ONG’s, vem todo mundo pra cima, não importa quem matou e quem morreu, quem bateu e quem apanhou. Muito menos quem tava certo. Porrada pode, matar não!
Já na China a coisa é um pouco diferente do resto do mundo. Lá a polícia não faz contenção nem baixa porrada. Na China a polícia mata mesmo, sem dó! Quando você vê noticia de manifestação na China, os locutores de noticiários nunca se preocupam com o que exatamente estavam em discussão, ou contra o que as pessoas estavam protestando. Se preocupam mais em anunciar quantas pessoas morreram. Como quem diz: “Olha, aqui é feio, mas lá é bem pior!”
Não vou dizer que isso não aconteça em outros lugares. A repercussão das eleições iranianas que o digam. Só que ainda assim a China se destaca em questão de matanças por dois motivos principais: em primeiro lugar, nas outras partes do mundo, o enfoque ainda é o motivo que ocasionou a manifestação e a (ou as) morte(s) é apenas um subproduto. Já na China a morte é o enfoque e o motivo da manifestação, quando mostrada, é só pra determinar onde ou como o sujeito morreu. Segundo, em qualquer outra parte do mundo, a polícia matar alguém durante uma manifestação é algo tão absurdo que a única conseqüência previsível é outra manifestação. Na China, é tão banal que quando não acontece é que chama a atenção.
Não sei bem porque que lá acontece assim. Porque num país tão grande quanto a China o desrespeito e o descaso com os diretos de seus cidadãos seja tão grande. Talvez seja justamente porque é grande e tenha a maior população do mundo. De repente, por lá se pensa que não faz muita diferença matar uns aqui e outros ali. Sempre tem mais gente pra substituir. Na China, matar um monte de gente durante uma manifestação não é massacre, é controle populacional!

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Lixos

Depois de sobreviver ao Collor, ao início do Real, à todas as crises do dólar e da economia mundial e a à tudo que esse mundo globalizado, ou seja, aquele em que, por mais longe que estejamos da China, cada espirro lá a gente escuta por aqui quase que instantaneamente, achei que já não me surpreenderia com nada que visse em termos de economia.
Mas devo confessar que, apesar de não ser ovo, fiquei chocado com a mais nova moda de importações brasileiras: LIXO!
Isso mesmo, o bom e velho lixo. Desembarcando em contêineres nos portos do Rio de Janeiro, de Santos e do Rio Grande do Sul. Cheios de lixo doméstico vindo de várias partes da Europa. Itália, Inglaterra, etc.
Ainda não entendi bem o conceito dessa importação. Mas é difícil crer que não produzimos lixo brasileiro em quantidade suficiente para atender a demanda nacional de desastres naturais, poluição e emporcalhamento que, ao que parece, tem sido uma das atividades mais prazerosas que o brasileiro tem realizado.
Digo isso por que parece-me que todos fazem isso. E sentem até mesmo um certo prazer algo lúbrico com a atividade de poluição e sujação toda. Parece um esporte nacional. Ah, se houvesse um modalidade de poluição nas Olimpíadas. Seriamos quase imbatíveis, perdendo, talvez, para os EUA. Mas só porque eles tem mais experiência e tempo de prática!
Mas voltando à importação de lixo, não acho que haja alguma relação entre esta atividade aparentemente lucrativa e uma baixa produção de lixo brasileira. Antes pelo contrário. Tenho a impressão, muito forte por sinal, de que a produção de lixo nacional supera em muito as expectativas. Somos um povo que se esforça nesse sentido. Não economizamos copos descartáveis, garrafas pet, papel, nem nada disso. Reciclagem então, pra que isso? Agora, se tem algo em que somos realmente imbatíveis para usar e jogar fora, sem a menor preocupação, é a sacola plástica de mercado!
Os empacotadores parecem ter prazer em por a maior quantidade possível de sacolas em suas mãos, cometendo absurdos de por um só produto em cada uma. E não estão nem um pouco preocupados com a sua necessidade:
- Vou por o refrigerante em duas sacolas porque em uma só arrebenta e cai quando você andar de moto.
- Mas eu estou de carro!
- tudo bem, então eu ponho três!
Não sei se isso é uma forma de vingança contra o patrão por baixos salários, do tipo “Se não vai me dar um aumento, vai gastar com sacolinhas!”
Pode ser. Ou então eles receberam um suborno do fabricante das sacolas:
- Se você dobrar o gasto das sacolas, te dou dez por cento.
- Fechado!
Bom, já que o problema não parece ser nossa produção de lixo, então porque a importação de lixo?
Me deram uma possibilidade que acho viável, se bem que precisa ser mais estudada. Já que, por princípio, tudo que é importado é melhor, desde carros até queijos, então porque não importar também o lixo?!
Teríamos, assim, um lixo de qualidade, não essa bagunça que vemos por ai, nos lixões que se espalham nas periferias das cidades (não digo nem mais das grandes cidades. Qualquer cidade que tenha mais de 10 habitantes já tem um lixão!) a céu aberto, quase como um monumento ao novo esporte nacional!
- Nossa, jogaram uma sacola com lixo na frente da minha casa essa noite. Que horror!
- É, mais era uma sacola Versace!

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A Eterna Danação do Zagueiro Absoluto

Há muito tempo eu conheci, por nome, um livro do Veríssimo (o filho) chamado “A Eterna Privação do Zagueiro Absoluto”. E eu tinha uma idéia muito romântica desse livro, por cauda do nome. Para mim, o livro tratava das aspirações e ambições humanas, que jamais se realizariam. Como o zagueiro absoluto, aquele bom mesmo, de quem o técnico jamais abriria mão, mas cuja ambição sempre foi se tornar o atacante e a estrela do time.
Como o Lucio, zagueiro como não se via à muito tempo (se é que se viu algum assim na nossa seleção! Eu mesmo não lembro), mas que vez ou outra resolve dar vazão à sua ambição de ser atacante, larga a defesa e se manda para o ataque, como quem diz: – Já que ninguém faz, faço eu! – Ás vezes dá certo e até sai gol. Ás vezes ele nos presenteia com um ataque do coração...
Mas voltando ao livro. Acabei comprando o bendito do livro pra descobrir que eu estava absalmente errado. Tudo bem, o Veríssimo continua ótimo, mas a eterna privação do zagueiro absoluto era só isso: a falta de um zagueiro decente, o tal zagueiro absoluto. Com ou sem ambições de atacante! É bom lembrar que o texto de que trata a tal privação é anterior ao Lúcio e suas admiráveis (e às vezes quase fatais) jogadas.
Finda a minha ignorância, permaneceu o fascínio. Continuo achando que o titulo seria adequando fora da colocação algo prosaica pretendida pelo LFV. Como uma coisa mais filosófica. Tudo bem, poderíamos escolher entre a interpretação literal ou mudar o titulo. Mas que graça isso teria?
Ainda gosto de pensar que a eterna privação do zagueiro absoluto é uma metáfora para todas as aspirações não realizadas. Tipo tomar Fanta ao invés de suco pro resto da vida ou virar bombeiro quando crescer...
Os nossos sonhos ingênuos que jamais ganharão forma, talvez porque sejamos bons naquilo que fazemos (cada um no seu quadrado!), porque sejamos o tal zagueiro absoluto, ou talvez simplesmente porque não somos bons naquilo que sonhávamos ser...
A pergunta que resta é: “Onde foi que tudo deu errado?” Reconheço que a vida adulta tem suas vantagens. Mas às vezes bata uma saudade da época em que éramos moleques.
No fim sempre sobra a resignação e a certeza de que Fanta enjoa e bombeiro de verdade não é igual bombeiro de filme americano e ainda por cima ganha mal pra caramba!

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Torcidas...

Eu li por esses dias um texto do Luis Fernando Veríssimo onde ele narrava uma historia sobre ele mesmo. Na historia, o personagem era um rapaz que tinha a habilidade de ficar invisível. Entre outras, uma das suas grandes proezas era entrar em campo e impedir os gols do adversário contra o Internacional.
O problema é que chegava uma hora em que ele se dava conta de que o que adiantava salvar os gols se o seu time só iria ganhar por causa da sua interferência irregular e se, no final do jogo, ninguém iria poder congratulá-lo.
Isso me ocorre agora em virtude do que aconteceu no jogo dessa quarta, em que as torcidas de Vasco e Corinthians se enfrentaram numa batalha campal, que inclusive resultou na morte de uma pessoa.
Fica difícil conceber que essas coisas estão acontecendo, de novo. Sim, porque já ouve uma época em que as torcidas iam para o estádio pra brigar. E deixavam de lado o espetáculo do futebol. As coisas caminhavam, ao que parecia, totalmente descontroladas, até que, num São Paulo e Palmeiras de juniores, um garoto morreu à pauladas! O garoto não tinha mais que 18 anos e morreu por causa de uma idiotice de alguém.
Daí por diante as coisas melhoraram. Depois de dissolvidas as falsas torcidas e da implantação de políticas de reeducação dos torcedores, estádios de futebol voltaram a ser lugares de lazer e festas de familia. Até agora!
O espetáculo dessa quarta-feira parece mostrar que ainda restam alguns pseudo-torcedores mais interessados em luta - livre do que em futebol. Afinal de contas, uma pessoa que vai para um jogo levando no carro um punhado de barras de ferro, acho que não tem boas intenções...
Os corintianos dizem que foram insultados pelos vascaínos que chegavam de ônibus. Os vascaínos se dizem vitimas de uma emboscada, preparada por torcedores corintianos. Não interessa de quem é a culpa. Ninguém nessa historia é totalmente culpado ou totalmente inocente. Ou vão querer me dizer que nunca ouviram o famoso “quando um não quer, dois não brigam”?! Mamãe sempre me dizia isso!
O pior é que quem paga a conta normalmente quem não tem nada a ver com a historia, como os donos dos carros estacionados que foram depredados ou as dignas torcidas corintiana e vascaínas, interessada em torcer e não em brigar, porque já se estuda a possibilidade do próximo Corinthians X Vasco ter torcida única!
E ainda tem gente que diz que “isso” é torcer pelo time! Se for verdade, eu torço errado desde sempre. E sabe que eu prefiro assim...

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Vôos e viagens

Mais uma vez ouço noticias sobre catástrofes aéreas. Um avião enorme simplesmente sumiu no mundo e ninguém sabe exatamente onde ele foi parar! Ele pode ter caído e afundado ou os passageiros resolveram tirar umas férias!
Tudo bem, sem piadas sobre uma coisa seria! É o impulso. Foi um acidente trágico. Um fim triste para pessoas que nem sequer se conheciam umas às outras. Um minuto de silencio
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Na verdade o que mais me preocupa nisso não é exatamente o acidente em si (não que isso diminua sua tragédia). O maior problema, na minha opinião, são as conseqüências que esse acidente vai trazer.
Desde que o Airbus 330 sumiu, eu vejo um alarmante aumento de comentários acerca da insegurança de voar, de como a ameaça do caos aéreo continua a pairar, etc. Pior, já ouvi pessoas falarem que estão reavaliaando se iam viajar de avião, pensando se vale à pena ou se o risco é grande demais.
Só o que ninguém se lembra é que, apesar de todo o estardalhaço da mídia com os acidentes aéreos, ainda se morre muito mais nas estradas do que nos céus. A diferença é que existem muito mais culpas e muito mais culpados do que em acidentes aéreos.
Em primeiro lugar não existem estradas nos céus! Não existem formas de se fazer tapa-buracos e desviar recursos! Não se privatiza vias aéreas! Não existem – pelo menos não deveriam existir – pilotos bêbados ou imprudentes!
Tudo bem que, num acidente aéreo, quando o avião cai, dificilmente sobram passageiros vivos. Mas a quantidade de aviões que caem é consideravelmente menor do que de ônibus que despencam de barrancos ou acertam carretas que vem no sentido contrario. Num acidente viário ate sobram alguns passageiros vivos pra contar o que aconteceu. Mas isso ainda não compensa a quantidade que morreu.
Só à titulo de comparação, ate agora, quantos aviões caíram ou se acidentaram, com vitimas, no Brasil? E no mundo? Se não me falha a memória (algo não muito raro) no Brasil só aquele da TAM, que acertou um deposito!
Já nas estradas, só essa semana, que eu tenha visto, já foram uns três acidentes envolvendo ônibus ou vans. Fora aqueles de que só participaram carros pequenos. Ou aqueles que não saíram no Jornal Nacional!
Alem disso, eu pelo menos, nunca ouvi falar de um avião que tenha batido em outro porque o piloto durmiu no volante! Na verdade, só uma vez eu vi um acidente comprovadamente causado por imprudência dos pilotos: aquele que envolvia um jato particular (que ninguém me tira da cabeça que estava sendo pilotado por um dos passageiros e não pelo piloto mesmo) e um avião (por uma tétrica coincidência, da TAM de novo!).
Alem disso, ate onde vão os meus parcos conhecimentos, avião quando cai, é acidente mesmo! Não existe má conservação de vias aéreas nem de aviões. Quando avião cai é porque alguma coisa tava muito errada e não tinha conserto. Acidentes acontecem, cest’la vie!
Então, da próxima vez que você for criticar os transportes aéreos, a não ser que você esteja voando de TABA – Transportes Aéreos da Bacia Amazônica (ou Transportes Aéreos Bastante Arriscados, pros íntimos!) – pense duas vezes! Você estará, muito provavelmente, mais seguro nos céus do que aqui em baixo, nesses buracos cheios de estrada que audaciosamente chamam de rodovias.
Só tem um problema com os aviões: se você quiser uma parada de emergência, saiba que não tem cordinha!

domingo, 31 de maio de 2009

Democracia de Demonstração

Por esses dias, eu estava ouvindo a explicação de um pai para seu filho sobre democracia. E dizendo que o Brasil é um país democrático. O filho, ainda pequeno, não conseguia falar a palavra democrático, então falou que o Brasil é uma país demo (nota: demo é a definição para programas de computador que não vem completos. Mas apenas como demonstração.).
Fiquei pensando nisso e concluí que o Brasil realmente é um país demo! Sua democracia é magnífica. Temos o melhor sistema de votação do mundo. Leis para tudo! Uma organização entre os três poderes, autônomos e independentes, invejável. Políticas sociais que priorizam a valorização do trabalhador. Enfim, tudo de bom!!
O problema é que tudo isso só é bom e perfeito na teoria. Tudo é demonstração! Como diz o ditado, tudo pra inglês ver. Ou americano, sei lá!
A constituição brasileira, a chamada Constituição Cidadã, tem uma invejável organização de direitos. Valoriza o povo acima de tudo, de forma à não permitir injustiças. Só não funciona!
A tão aclamada valorização é solapada diuturnamente por poderosos cujos únicos interesses são o lucro e a própria satisfação. São deixadas de lado todas as garantias para o cidadão, substituídas pela manutenção de interesses pessoais e pela sustentação de oligarquias políticas.
Nosso sistema eleitoral já foi considerado o mais seguro e organizado do mundo! E não tem ninguém votando pra Presidente três dias antes do começo oficial da votação! O sistema seria perfeito e à prova de erros, não fossem os candidatos. Um pior que o outro! E não temos escolha. Se votamos nos antigos caciques, não mudamos. Se votamos na novidade, ficamos entre criar um novo inapto corrupto (afinal, continuo defendendo a teoria de que político honesto é aquele que não se elegeu) ou eleger alguém que não irá fazer nada, nem de bom, nem de ruim (normalmente, no final das contas, já que fica entre se corromper ou não atuar, eles acabam se corrompendo).
Quanto aos tais três poderes nem se fala. Não sei o que é pior, se o conchavo entre eles ou a disputa de poder.
De um lado, eles se protegem, no intuito de, quando precisarem, serem protegidos também. Persegue-se o nepotismo, institui-se o nepotismo cruzado. Tenta atacar um deles pra você ver. O mundo inteiro desaba na sua cabeça!
Em contrapartida, se todos se protegem contra, na falta de expressão melhor, ameaças externas, estão se matando entre si. As disputas de poder, cada vez mais demonstram que, na verdade, eles não têm a menor intenção de trabalhar pelo e para o povo. Apenas querem defender seus próprios interesses (de novo!). Cada um dos três poderes, que deveriam ser iguais e sem relação hierárquica entre si, tenta se sobressair aos outros, tentando fazer com que suas decisões tenham de ser obedecidas pelos outros.
O Código Civil Brasileiro, escrito em 1916 por Clóvis Beviláqua, foi aposentado recentemente, considerado ultrapassado. Já o “Novo” Código foi escrito em 1975. E pior, teorias que permearam o Código de 1916 estão sendo usadas agora na França! Ou seja, as leis brasileiras são tão evoluídas, que décadas depois de terem sido escritas ainda são atuais! O problema, de novo, é a execução das tais leis. Os poderosos passam por cima das leis como tratores e os juizes se acham deuses infalíveis, cujas idéias são melhores e superiores à própria Constituição! Definitivamente, não dá pra competir com isso.
No fim de tudo, a versão Demo da democracia brasileira perdura de tempos imemoriais até os dias de hoje. A esperança é que a geração atual é formada de garotos viciados em computador. Quem sabe eles conseguem instalar a versão estendida do programa e aposentem a Demo!!!

quinta-feira, 28 de maio de 2009

FOGO! FOGO! – Traz o churrasco...

Alguns dias atrás, comprei um livro do Luis Fernando Veríssimo chamado “O mundo é Bárbaro e o que nós temos a ver com isso”. Nem preciso dizer que os textos são ótimos, né?! Não há muitas surpresas quando se trata do Veríssimo.
Mas o que realmente me chamou a atenção foi a capa. É uma figura do próprio Veríssimo, sentado de costas pra gente e a frente de um computador, contemplando uma Terra em chamas.
Eu ainda não entendi bem o significado dessa capa. Às vezes eu penso (é, por mais incrível que possa parecer, eu penso) que o Veríssimo tá ali como quem diz: - Tá vendo, eu avisei! Agora não posso fazer mais nada!! – Outras vezes, eu imagino que ele tá ali sentado, tentando entender o que tá acontecendo e o que ele pode fazer.
É assim que o mundo tem se dividido ultimamente. Em pessoas que ficam paradas, olhando as coisas acontecerem, e aquelas que ficam pensando o que exatamente podem fazer.
Só tem ma coisinha: quem tá olhando tudo acontecer nem pode dizer que tinha avisado, porque muito poucos dos que estão parados disseram alguma coisa antes. E quem tá pensando o que pode fazer, fica fazendo só isso mesmo, pensando. Não age nem se movimenta.
O mundo tá ai, pegando fogo. Literalmente, em alguns lugares, tipo Cuiabá, com o clima se aquecendo cada vez mais. Chuvas, inundações e desastres onde sempre foi um deserto. Seca e perda de plantações no Sul, lugar famoso por sua fertilidade. Tá tudo diferente. Pior, tá tudo errado! E toca soltar fumaça no ar!!!
O homem já não respeita o ambiente e, pela Lei da Ação & Reação, de Newton, o ambiente também não respeita mais o homem. A Natureza, como uma fera voraz, destrói tudo que está em seu caminho. E o homem, na sua ânsia em fazer o mundo mais confortável para si mesmo, não pensa no mal que está fazendo à Natureza. E toca soltar fumaça!!
Tudo bem, às vezes a gente vê alguém tentando fazer alguma diferente. O próprio Veríssimo faz o que pode; e escreve. Escreve pra caramba, aliás. Outros também fazem a sua parte. Mas mesmo assim, o grosso da coisa ninguém resolve. O que seria necessário para minimizar os efeitos da devastação humana na Terra era um propósito real e desinteressado das grandes potências mundiais. Mas isso só vai acontecer no dia de São Nunca, de tardezinho... Enquanto isso, toca fumaça no ar!!!
Isso porque, para diminuir os efeitos nocivos das suas indústrias na Natureza, as grandes potências tem de renunciar à duas coisas: lucro e conforto. Só que essas coisas, pelo menos pra eles, são irrenunciáveis!
Enquanto esperamos essa (i)resolução das pessoas que movem o mundo, podemos ir tentando apagar o incêndio com uma colherzinha de chá. Ou usar o fogo pra assar marshmelow!!! E toca mais um pouquinho de fumaça...

terça-feira, 26 de maio de 2009

O Rei e os Bobos

Li em algum lugar que o Brasil vive em um parlamentarismo às acessas. Explico. Segundo essa teoria, num parlamentarismo “normal”, como na Inglaterra, por exemplo, quem governa é o Parlamento e a Familia Real dá o espetáculo, com escândalos e noticias em tablóides.
No Brasil, quem governa é o Lula, pela prática de decretar (decretar: mandar num país através de decretos!). Já o Congresso existe para dar o espetáculo, com escândalo atrás de escândalo.
Mas eu discordo. Veementemente, aliás. Não que o Lula não tente realmente governar este país por decretos. Isso ele faz até demais. O que devemos nos perguntar em primeiro lugar é quanto disso ele faz por uma vontade mal refreada de reinar e quanto é para evitar ter de passar pelo espetáculo do Congresso Nacional.
Isso porque as leis forjadas quando saíamos de um regime ditatorial-absolutista, onde imperava o “manda quem pode, obedece quem quer viver”, exigem uma subserviência ao Congresso que tinha fundamento ao fim da ditadura, mas que não se sustenta com o atual parlamento, corrupto e ineficiente, que só pensa em si mesmo.
Quem nunca ouviu falar em votações e debates adiados no Congresso? Quem nunca se exasperou com a história das convocações extraordinárias, pagas com nosso dinheiro, durante as férias, que, não fosse isso, seriam de uns dois meses, fora o recesso no meio do ano (eu tenho 30 dias e olha lá!)? Que atire um projeto de lei quem nunca achou que os congressistas ganham de mais pra trabalhar de menos!
Tudo isso serve pra provar que, pelo menos às vezes, o presidente tem de “decretar” pra tentar fugir da lentidão lesmática do Congresso. Não sou ingênuo ou inocente a ponto de pensar que todas as intenções do Lula são em prol da coletividade. Até porque defendo a teoria de que o único político honesto que existe é o que não se elegeu. Mas pelo menos ele acerta algumas. Melhor que o EfeAgá, que não acertava nenhuma e ainda tentava faze a gente acreditar em tudo que ele dizia.
Outra coisa que não concordo é quando se diz que, atualmente, o Congresso vive para dar o espetáculo. Quando a gente ouve, ou no caso, lê isso, temos a impressão de que só agora que os deputados resolveram assumir o papel de bobos da corte e que antes eram todos castos e sérios.
Acho mais que essa corrupção sempre existiu. Sempre fomos roubados e achincalhados. Só que a gente não sabia. E porque agora sabemos? Bom, pra mim, agora a gente sabe dessas coisas porque finalmente apareceu alguém que está a fim de trazer tudo à tona, doa à quem doer. Que não quer mais que impere o deixa-pra-láismo de outros tempos. Alguém que esta tentando fazer o certo e não o fácil. E quem é este ser iluminado? Quem? Jesus, Maria, José, quem??
Eu só consigo pensar em uma pessoa com caráter e poder pra fazer isso. Nosso rei-decretante. Integrante da massa e eleito pelo povo. E como parte desse povo, tem os seus defeitos e seus vícios. É muito fácil dizer o que faríamos se estivéssemos no lugar do Lula, desde que jamais cheguemos lá.
Sei que o Lula não é um paladino da justiça ou um protótipo da perfeição honesta. Mas entre um desvio e outro, a gente percebe que ele pensa, nem que seja só um cadinho, no povo que o elegeu. E faz o que pode pra ajudar. Nem sempre dá certo, mas pelo menos tenta. O que já é muito se compararmos com o que fizeram os herdeiros das oligarquias políticas e os pseudo-eruditos que habitaram o planalto antes do operário.
E se o Lula é questionado por tomar uma cachacinha no final de semana (coisa que todo brasileiro normal faz, oras!), pelo menos ele não discursa em inglês no Brasil só pra agradar presidente estrangeiro.

Provas e Vestibulares

Agora inventaram mais uma moda, o vestibular unificado. Na minha época, o vestibular era uma batalha campal, vencida passo à passo, ano à ano. Ganhava quem conseguia abastecer mais a sua trincheira, quer dizer, a sua memória, de coisas que mais tarde se revelariam absolutamente inúteis. Ou você vai me dizer que alguma vez usou a fórmula de Báskara para alguma coisa? Eu, pelo menos, nunca usei.
Anos estudando com afinco e esmero. Tínhamos chegado a um ponto em que o colégio não era pra ensinar e formar cidadãos. Era um preparatório! Tudo visava uma simpática prova de marcar “xis”. Ou de “Verdadeiro” ou “Falso”. Até mesmo as “atualidades” que se ensinavam eram aquelas que tinham mais possibilidades de cair no vestibular.
Mas pelo menos, na minha época a briga era menos injusta. Cada um competia com seus conterrâneos, sem distinção. Não que os filhos bem nascidos e educados em escolas particulares não tivessem mais chances, mas pelo menos, se te desse um branco na hora da prova, era só marcar “C” em tudo, e torce pra não zerar.
O primeiro modismo com o vestibular foram as cotas. As cotas, que pessoalmente eu nunca entendi direito, são assim: o sujeito vai lá, diz que é negro e concorre à vagas diferentes das dos outros?! Jamais direi que o Brasil é um país justo e livre de preconceitos, mas a prova de vestibular sempre foi uma exceção. Isso porque o vestibular é corrigido por uma máquina, que vai comparar aquelas infames bolinhas do gabarito, que você se matou para preencher, com as respostas certas. E até onde eu saiba, bolinha de negro, desculpa, de afro-descendente é igualzinha a bolinha de branco! Bom, pelo menos essas bolinhas!!
E mesmo as provas em que você era obrigado à escrever, o sujeito que ia corrigir a prova não sabia se você era branco, negro, azul ou amarelo. E se por acaso a letra de um negro for mais feia do que a de um branco, então eu, descendente direto de alemães imigrantes, estou na raça errada, porque a minha letra é feia pra caramba!
Uma vez fiz esse questionamento para uma professora, que participava de movimentos em defesa da raça negra. Ela me respondeu que tinha que ser assim, porque os negros pertenciam às classes mais pobres da população. Certo, certo, concordo com isso. Mas e os (poucos, é verdade) negros que não estão na parte inferior da pirâmide? E os brancos que também não puderam estudar porque também são pobres? Até hoje, nem ela nem ninguém conseguiu me dar uma resposta satisfatória. Pode tentar, se quiser.
Fora essa questão sócio-filosófica, as cotas ainda causaram situações tragicômicas, como a do caso da UNB, cuja “seleção” de raça é feita através de uma foto tirada na hora da inscrição. Lá, dois gêmeos idênticos solicitaram a inscrição nas cotas e tiraram a tal foto. No fim da avaliação, um foi considerado branco, e o outro, não! Pode um trem desses?? Sei não, mas ainda acho que a culpa foi do fotógrafo. Tinha luz demais numa foto e de menos na outra.
Depois de tudo isso, ainda me vem com esse negócio de vestibular unificado, medido através do ENEM. Antes, pelo menos, se alguém lá do eixo Sul-Sudeste quisesse vir roubar as nossas vagas aqui do Mato Grosso, ele tinha que pelo menos vir até aqui, ser assado vivo no nosso calor, sofrer com os costumes locais e ainda por cima passar na prova.
Agora ele pode tomar o lugar dum conterrâneo nosso sem nem mesmo sair do ar-condicionado onda já habita. A cada dia a coisa vai ficando mais fácil. A gente só precisa descobrir exatamente pra quem.
Acho que eu devia pedir uma compensação, uma indenização por todo o estudo e esforço que agora não existe mais. É injusto que eu, e provavelmente você, tenha ralado tanto e os outros peguem tudo de mão beijada. Se não agora, na próxima bobagem que fizerem com o vestibular.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Pobreza

Tava outro dia num bar, quando um dos garotos da mesa ao lado falou:
- Eu queria ser pobre um dia...
Imediatamente o outro respondeu – Mas você não vive dizendo que é pobre??
- Sim, queria ser pobre um dia! Ser pobre todo dia é foda!!!
Depois dessa interessante observação, comecei a prestar atenção à conversa deles. Não variava muito: futebol, mulheres (sempre depreciativos), baladas. Nada muito interessante.
Não os ouvi falarem uma vez sequer sobre livros lidos, a economia mundial, as próximas eleições, nada que fosse minimamente cultural.
Diante disso, eu fiquei pensando que o sujeito, e os amigos dele, realmente é pobre. Não pobres no sentido estrito de desprovidos de dinheiro, até porque todos eles tinham carros novos.
Mas no sentido de falta de espírito. Taí o Aurélião que não me deixa mentir: pobreza é a “falta do necessário à vida (...)”. Mas afinal, o que é necessário à vida? Se você perguntar para um biólogo, um nutricionista, ou um médico, eles provavelmente discorrerão sobre alimentos, proteínas, essas coisas que você, assim como eu, não entende nada. Já um economista ou alguém que trabalha nesse setor te mostrará, como nos mostram todas as noites no Jornal Nacional, um monte de tabelas, números e índices, que a gente também não entende.
Para o trabalhador comum a definição de pobreza é mais simples, e dessa vez você com certeza iria entender: falta de dinheiro. No caso de um sujeito de classe media, falta de dinheiro pra passear de vez em quando, pra fazer uma viagem nas férias ou pra trocar de carro às vezes. Para alguém de classe mais baixa, não ter dinheiro pra por comida no prato dos filhos toda noite...
Só que para um pretenso escritor como eu, pobreza é muito mais do que falta de dinheiro. Pelo menos na minha modesta (e talvez medíocre) concepção, a “falta do necessário à vida” vai bem mais além da ideologia pequeno burguesa dos bens materiais. Necessário à vida é também o acesso à cultura. Mais do que simples acesso, interesse.
Já falei antes sobre transformarem o funk em “cultura nacional”. Pois é assim que a gente tem visto ser tratada a nossa cultura. Tem sido chamado de regionalismo erros grosseiros de português, como “crínica” ou “quato”. Isso não é regionalismo. É burrice mesmo!
É cada vez mais raro você encontrar alunos que tenham lido a bibliografia recomendada por um professor. Se leram alguma coisa foi o resumo publicado na internet. Ou pior ainda, está cada vez mais difícil encontrar um professor que tenha uma bibliografia pra recomendar!
Mas o pior é que isso é só uma causa. E se a Lei de Newton estiver certa e para cada ação existir uma reação, as conseqüências dessa falta de cultura no Brasil são a violência e a criminalidade. Não exige muito raciocinar que o principal motivo para a crescente onda de violência reside na mente vazia de jovens, que, sem opção de estudo, partem para a criminalidade.
Principalmente quando esse jovem vê que pra conseguir um castelo não adianta estudar. O negocio é mesmo roubar. E nem isso o infeliz aprendeu direito, porque o dono do castelo talvez perca seu lugar no Congresso. Mas o ladrãozinho vai pra cadeia mesmo.
Podem falar o que quiserem, que o mundo não dá mais tempo para a leitura, que hoje o importante é saber só sobre o trabalho que desenvolve, que o cara chega cansado em casa e não tem tempo pra ajudar o filho num dever da escola. Isso pra mim é balela.
Já vi muitas mães chegarem em casa cansadas, estressadas e ainda assim foram ajudar o filho na tarefa de casa. Também já vi pessoas que trabalham oito, nove horas por dia, passam mais três horas pelo menos num ônibus lotado e ainda tem tempo pra ler, nem que seja no banheiro. Quando eu trabalhava numa livraria, meu chefe falou que se você quer muito ler um livro, você precisa ter pelo menos ter cópias: uma pra andar com você, uma pra ficar na sua casa e uma pra ficar no seu banheiro!
Posso estar superestimando o poder da leitura, e subestimando a capacidade de leitura das pessoas à minha volta, mas cada vez que vejo uma pessoa falar que tem um “pobrema” eu tenho uma súbita contorção, como se fosse desmaiar.
Talvez o Brasil seja a terra do “tudo se ajeita”. É difícil ver uma grande comoção social, ou algum grande protesto. O último que eu vi foi pra tentar desencalhar um monte de mulher sem namorado! Talvez o Brasil acabe por ser mesmo um país pacifico, onde tentamos arrumar tudo na base da conversa e do jeitinho. E que se não arrumar, “piorar não vai mesmo!”
Mas suspeito que essa apatia da população tenha menos a ver com um espírito indolente e pacifista do que com uma crônica falta de saber, cuidadosamente estruturada pelos barões, agora congressistas, para que o voto de cabresto ainda valha. E continuamos a vestir esse cabresto de rendas douradas chamado “redução do analfabetismo” e “aumento das vagas na faculdade”.
Sei não, posso até estar errado, mas o Brasil não é pobre em inteligência. Muito pelo contrário, tem inteligência de mais. Só está nas mãos erradas...

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Ceia de Natal

Maria Rosa desceu a rua. Uma bela mulata com a cesta de compras. Vai pra casa preparar a ceia de Natal do seu homem. Nem mesmo podia chamar de seu, afinal não eram casados. Ele havia se casado antes, mas se desquitara. Nunca revelara o motivo e ela nunca perguntara.
Era véspera de Natal e Maria Rosa se lembrou do presente do Alvarez, comprado uns dias antes. Um relógio de prata, importado, muito bem acabado. Combinava com ele, era sóbrio e elegante, assim como o Alvarez, ou pelo menos are assim que pensava Maria Rosa. Ela às vezes imaginava como é que tinha conquistado aquele homem alto, bonito, elegante, charmoso e culto.
Havia descoberto que era muito mais caro do que seu parco orçamento poderia comprar, mas mesmo assim levou-o. Decididamente, combinava com o Alvarez. Com esses pensamento à lhe indicar o caminho, segui para casa, fazer o jantar.
O Alvarez já havia avisado que iria demorar, já que tinha trocado o turno com um colega que precisava ver a família. Era um amigo dos amigos, e Maria Rosa admirava-o por isso.
Nove e meia da noite, o peru no forno, Maria Rosa atende ao telefone: o amigo com quem o Alvarez trocara de turno ligara para desejar Feliz Natal. Pergunta por Alvarez. Maria Rosa lhe responde que ainda não chegou do serviço
- Mas só o segurança trabalha hoje. Tudo parado por causa do Natal!
O fone cai no chão. Ao recolocá-lo no gancho, ainda em choque, ele toque quase que instantaneamente. Maria Rosa, como se o telefone fosse algum animal peçonhento. O instinto, entretanto, lhe diz para atender. É o Alvarez.
Com a habilidade de uma atriz consumada, Maria Rosa aceita a desculpa de Alvarez para o atraso.
- Não demora mais nada, amor! Já chego.
Então Maria Rosa se lembra de ter visto, quando voltava pra casa com as compras, um carro parecido com o do Alvarez. Um carro popular, como muitos por aí, mas alguns detalhes semelhantes haviam chamado sua atenção. Não imaginara que podia ser mesmo o dele.
Ela volta ao local aonde vira o carro. Ainda está estacionado. Uma olhada mais de perto lha diz que é mesmo o carro do Alvarez. Ela olha ao redor, tentando adivinhar onde estará ele. Súbito, uma risada ecoa de um dos prédios próximos até a rua. Mesmo sem os anos de convívio, aquela risada seria inconfundível. E veio de um bordel.
Maria Rosa se aproxima da janela. A iluminação em tons de vermelho dificulta a visão, o lugar está quase vazio. È véspera de Natal. Pela janela Maria Rosa vê Alvarez, sentado, numa roda de amigos desconhecidos dela, e com uma mulher, branca, grande, ao colo. Cada coxa da mulher daria as duas de Maria Rosa. A mulher é muito mais alta. Esta quase nua, uns trapos apenas cobrem suas partes intimas e as mãos de Alvarez, que tentam arrancar as já parcas roupas da mulher. Ela parece nem se importar. E então, Alvarez vê Maria Rosa pela janela.
Ela foge, ela vai atrás. O carro demora a pegar. Quando Alvarez chega ao apartamento, a porta esta trancada. Ele bate, esmurra a porta, mas nada. Durante algumas horas ele argumenta em vão com um pedaço de madeira. Não fosse por alguns soluços sentidos que ouvira quando chegou, Alvarez diria que a mulata nem estava em casa.
Então ele percebe um cheiro estranho e diferente. Adocicado. Aquilo lhe aperta a garganta. Alvarez arromba a porta do apartamento. Vai à cozinha. O peru, ainda cru, em cima do fogão. No chão, com a cabeça dentro do forno, Maria Rosa. Ele tenta reanimá-la. Em vão. O gás arruinara seus pulmões irremediavelmente. Ela se suicidara de desgosto e mágoa.
O primeiro pensamento de Alvarez era o de seguir-lhe os passos. Mas falta-lhe coragem. Todas as grandezas e qualidades que Maria Rosa tanto apreciava, inclusive a coragem e a nobreza, não passavam de um embuste.
E na noite de Natal, Alvarez iria se consolar nos braços da grande alemã do prostíbulo de Madame Dolores.