domingo, 31 de maio de 2009

Democracia de Demonstração

Por esses dias, eu estava ouvindo a explicação de um pai para seu filho sobre democracia. E dizendo que o Brasil é um país democrático. O filho, ainda pequeno, não conseguia falar a palavra democrático, então falou que o Brasil é uma país demo (nota: demo é a definição para programas de computador que não vem completos. Mas apenas como demonstração.).
Fiquei pensando nisso e concluí que o Brasil realmente é um país demo! Sua democracia é magnífica. Temos o melhor sistema de votação do mundo. Leis para tudo! Uma organização entre os três poderes, autônomos e independentes, invejável. Políticas sociais que priorizam a valorização do trabalhador. Enfim, tudo de bom!!
O problema é que tudo isso só é bom e perfeito na teoria. Tudo é demonstração! Como diz o ditado, tudo pra inglês ver. Ou americano, sei lá!
A constituição brasileira, a chamada Constituição Cidadã, tem uma invejável organização de direitos. Valoriza o povo acima de tudo, de forma à não permitir injustiças. Só não funciona!
A tão aclamada valorização é solapada diuturnamente por poderosos cujos únicos interesses são o lucro e a própria satisfação. São deixadas de lado todas as garantias para o cidadão, substituídas pela manutenção de interesses pessoais e pela sustentação de oligarquias políticas.
Nosso sistema eleitoral já foi considerado o mais seguro e organizado do mundo! E não tem ninguém votando pra Presidente três dias antes do começo oficial da votação! O sistema seria perfeito e à prova de erros, não fossem os candidatos. Um pior que o outro! E não temos escolha. Se votamos nos antigos caciques, não mudamos. Se votamos na novidade, ficamos entre criar um novo inapto corrupto (afinal, continuo defendendo a teoria de que político honesto é aquele que não se elegeu) ou eleger alguém que não irá fazer nada, nem de bom, nem de ruim (normalmente, no final das contas, já que fica entre se corromper ou não atuar, eles acabam se corrompendo).
Quanto aos tais três poderes nem se fala. Não sei o que é pior, se o conchavo entre eles ou a disputa de poder.
De um lado, eles se protegem, no intuito de, quando precisarem, serem protegidos também. Persegue-se o nepotismo, institui-se o nepotismo cruzado. Tenta atacar um deles pra você ver. O mundo inteiro desaba na sua cabeça!
Em contrapartida, se todos se protegem contra, na falta de expressão melhor, ameaças externas, estão se matando entre si. As disputas de poder, cada vez mais demonstram que, na verdade, eles não têm a menor intenção de trabalhar pelo e para o povo. Apenas querem defender seus próprios interesses (de novo!). Cada um dos três poderes, que deveriam ser iguais e sem relação hierárquica entre si, tenta se sobressair aos outros, tentando fazer com que suas decisões tenham de ser obedecidas pelos outros.
O Código Civil Brasileiro, escrito em 1916 por Clóvis Beviláqua, foi aposentado recentemente, considerado ultrapassado. Já o “Novo” Código foi escrito em 1975. E pior, teorias que permearam o Código de 1916 estão sendo usadas agora na França! Ou seja, as leis brasileiras são tão evoluídas, que décadas depois de terem sido escritas ainda são atuais! O problema, de novo, é a execução das tais leis. Os poderosos passam por cima das leis como tratores e os juizes se acham deuses infalíveis, cujas idéias são melhores e superiores à própria Constituição! Definitivamente, não dá pra competir com isso.
No fim de tudo, a versão Demo da democracia brasileira perdura de tempos imemoriais até os dias de hoje. A esperança é que a geração atual é formada de garotos viciados em computador. Quem sabe eles conseguem instalar a versão estendida do programa e aposentem a Demo!!!

quinta-feira, 28 de maio de 2009

FOGO! FOGO! – Traz o churrasco...

Alguns dias atrás, comprei um livro do Luis Fernando Veríssimo chamado “O mundo é Bárbaro e o que nós temos a ver com isso”. Nem preciso dizer que os textos são ótimos, né?! Não há muitas surpresas quando se trata do Veríssimo.
Mas o que realmente me chamou a atenção foi a capa. É uma figura do próprio Veríssimo, sentado de costas pra gente e a frente de um computador, contemplando uma Terra em chamas.
Eu ainda não entendi bem o significado dessa capa. Às vezes eu penso (é, por mais incrível que possa parecer, eu penso) que o Veríssimo tá ali como quem diz: - Tá vendo, eu avisei! Agora não posso fazer mais nada!! – Outras vezes, eu imagino que ele tá ali sentado, tentando entender o que tá acontecendo e o que ele pode fazer.
É assim que o mundo tem se dividido ultimamente. Em pessoas que ficam paradas, olhando as coisas acontecerem, e aquelas que ficam pensando o que exatamente podem fazer.
Só tem ma coisinha: quem tá olhando tudo acontecer nem pode dizer que tinha avisado, porque muito poucos dos que estão parados disseram alguma coisa antes. E quem tá pensando o que pode fazer, fica fazendo só isso mesmo, pensando. Não age nem se movimenta.
O mundo tá ai, pegando fogo. Literalmente, em alguns lugares, tipo Cuiabá, com o clima se aquecendo cada vez mais. Chuvas, inundações e desastres onde sempre foi um deserto. Seca e perda de plantações no Sul, lugar famoso por sua fertilidade. Tá tudo diferente. Pior, tá tudo errado! E toca soltar fumaça no ar!!!
O homem já não respeita o ambiente e, pela Lei da Ação & Reação, de Newton, o ambiente também não respeita mais o homem. A Natureza, como uma fera voraz, destrói tudo que está em seu caminho. E o homem, na sua ânsia em fazer o mundo mais confortável para si mesmo, não pensa no mal que está fazendo à Natureza. E toca soltar fumaça!!
Tudo bem, às vezes a gente vê alguém tentando fazer alguma diferente. O próprio Veríssimo faz o que pode; e escreve. Escreve pra caramba, aliás. Outros também fazem a sua parte. Mas mesmo assim, o grosso da coisa ninguém resolve. O que seria necessário para minimizar os efeitos da devastação humana na Terra era um propósito real e desinteressado das grandes potências mundiais. Mas isso só vai acontecer no dia de São Nunca, de tardezinho... Enquanto isso, toca fumaça no ar!!!
Isso porque, para diminuir os efeitos nocivos das suas indústrias na Natureza, as grandes potências tem de renunciar à duas coisas: lucro e conforto. Só que essas coisas, pelo menos pra eles, são irrenunciáveis!
Enquanto esperamos essa (i)resolução das pessoas que movem o mundo, podemos ir tentando apagar o incêndio com uma colherzinha de chá. Ou usar o fogo pra assar marshmelow!!! E toca mais um pouquinho de fumaça...

terça-feira, 26 de maio de 2009

O Rei e os Bobos

Li em algum lugar que o Brasil vive em um parlamentarismo às acessas. Explico. Segundo essa teoria, num parlamentarismo “normal”, como na Inglaterra, por exemplo, quem governa é o Parlamento e a Familia Real dá o espetáculo, com escândalos e noticias em tablóides.
No Brasil, quem governa é o Lula, pela prática de decretar (decretar: mandar num país através de decretos!). Já o Congresso existe para dar o espetáculo, com escândalo atrás de escândalo.
Mas eu discordo. Veementemente, aliás. Não que o Lula não tente realmente governar este país por decretos. Isso ele faz até demais. O que devemos nos perguntar em primeiro lugar é quanto disso ele faz por uma vontade mal refreada de reinar e quanto é para evitar ter de passar pelo espetáculo do Congresso Nacional.
Isso porque as leis forjadas quando saíamos de um regime ditatorial-absolutista, onde imperava o “manda quem pode, obedece quem quer viver”, exigem uma subserviência ao Congresso que tinha fundamento ao fim da ditadura, mas que não se sustenta com o atual parlamento, corrupto e ineficiente, que só pensa em si mesmo.
Quem nunca ouviu falar em votações e debates adiados no Congresso? Quem nunca se exasperou com a história das convocações extraordinárias, pagas com nosso dinheiro, durante as férias, que, não fosse isso, seriam de uns dois meses, fora o recesso no meio do ano (eu tenho 30 dias e olha lá!)? Que atire um projeto de lei quem nunca achou que os congressistas ganham de mais pra trabalhar de menos!
Tudo isso serve pra provar que, pelo menos às vezes, o presidente tem de “decretar” pra tentar fugir da lentidão lesmática do Congresso. Não sou ingênuo ou inocente a ponto de pensar que todas as intenções do Lula são em prol da coletividade. Até porque defendo a teoria de que o único político honesto que existe é o que não se elegeu. Mas pelo menos ele acerta algumas. Melhor que o EfeAgá, que não acertava nenhuma e ainda tentava faze a gente acreditar em tudo que ele dizia.
Outra coisa que não concordo é quando se diz que, atualmente, o Congresso vive para dar o espetáculo. Quando a gente ouve, ou no caso, lê isso, temos a impressão de que só agora que os deputados resolveram assumir o papel de bobos da corte e que antes eram todos castos e sérios.
Acho mais que essa corrupção sempre existiu. Sempre fomos roubados e achincalhados. Só que a gente não sabia. E porque agora sabemos? Bom, pra mim, agora a gente sabe dessas coisas porque finalmente apareceu alguém que está a fim de trazer tudo à tona, doa à quem doer. Que não quer mais que impere o deixa-pra-láismo de outros tempos. Alguém que esta tentando fazer o certo e não o fácil. E quem é este ser iluminado? Quem? Jesus, Maria, José, quem??
Eu só consigo pensar em uma pessoa com caráter e poder pra fazer isso. Nosso rei-decretante. Integrante da massa e eleito pelo povo. E como parte desse povo, tem os seus defeitos e seus vícios. É muito fácil dizer o que faríamos se estivéssemos no lugar do Lula, desde que jamais cheguemos lá.
Sei que o Lula não é um paladino da justiça ou um protótipo da perfeição honesta. Mas entre um desvio e outro, a gente percebe que ele pensa, nem que seja só um cadinho, no povo que o elegeu. E faz o que pode pra ajudar. Nem sempre dá certo, mas pelo menos tenta. O que já é muito se compararmos com o que fizeram os herdeiros das oligarquias políticas e os pseudo-eruditos que habitaram o planalto antes do operário.
E se o Lula é questionado por tomar uma cachacinha no final de semana (coisa que todo brasileiro normal faz, oras!), pelo menos ele não discursa em inglês no Brasil só pra agradar presidente estrangeiro.

Provas e Vestibulares

Agora inventaram mais uma moda, o vestibular unificado. Na minha época, o vestibular era uma batalha campal, vencida passo à passo, ano à ano. Ganhava quem conseguia abastecer mais a sua trincheira, quer dizer, a sua memória, de coisas que mais tarde se revelariam absolutamente inúteis. Ou você vai me dizer que alguma vez usou a fórmula de Báskara para alguma coisa? Eu, pelo menos, nunca usei.
Anos estudando com afinco e esmero. Tínhamos chegado a um ponto em que o colégio não era pra ensinar e formar cidadãos. Era um preparatório! Tudo visava uma simpática prova de marcar “xis”. Ou de “Verdadeiro” ou “Falso”. Até mesmo as “atualidades” que se ensinavam eram aquelas que tinham mais possibilidades de cair no vestibular.
Mas pelo menos, na minha época a briga era menos injusta. Cada um competia com seus conterrâneos, sem distinção. Não que os filhos bem nascidos e educados em escolas particulares não tivessem mais chances, mas pelo menos, se te desse um branco na hora da prova, era só marcar “C” em tudo, e torce pra não zerar.
O primeiro modismo com o vestibular foram as cotas. As cotas, que pessoalmente eu nunca entendi direito, são assim: o sujeito vai lá, diz que é negro e concorre à vagas diferentes das dos outros?! Jamais direi que o Brasil é um país justo e livre de preconceitos, mas a prova de vestibular sempre foi uma exceção. Isso porque o vestibular é corrigido por uma máquina, que vai comparar aquelas infames bolinhas do gabarito, que você se matou para preencher, com as respostas certas. E até onde eu saiba, bolinha de negro, desculpa, de afro-descendente é igualzinha a bolinha de branco! Bom, pelo menos essas bolinhas!!
E mesmo as provas em que você era obrigado à escrever, o sujeito que ia corrigir a prova não sabia se você era branco, negro, azul ou amarelo. E se por acaso a letra de um negro for mais feia do que a de um branco, então eu, descendente direto de alemães imigrantes, estou na raça errada, porque a minha letra é feia pra caramba!
Uma vez fiz esse questionamento para uma professora, que participava de movimentos em defesa da raça negra. Ela me respondeu que tinha que ser assim, porque os negros pertenciam às classes mais pobres da população. Certo, certo, concordo com isso. Mas e os (poucos, é verdade) negros que não estão na parte inferior da pirâmide? E os brancos que também não puderam estudar porque também são pobres? Até hoje, nem ela nem ninguém conseguiu me dar uma resposta satisfatória. Pode tentar, se quiser.
Fora essa questão sócio-filosófica, as cotas ainda causaram situações tragicômicas, como a do caso da UNB, cuja “seleção” de raça é feita através de uma foto tirada na hora da inscrição. Lá, dois gêmeos idênticos solicitaram a inscrição nas cotas e tiraram a tal foto. No fim da avaliação, um foi considerado branco, e o outro, não! Pode um trem desses?? Sei não, mas ainda acho que a culpa foi do fotógrafo. Tinha luz demais numa foto e de menos na outra.
Depois de tudo isso, ainda me vem com esse negócio de vestibular unificado, medido através do ENEM. Antes, pelo menos, se alguém lá do eixo Sul-Sudeste quisesse vir roubar as nossas vagas aqui do Mato Grosso, ele tinha que pelo menos vir até aqui, ser assado vivo no nosso calor, sofrer com os costumes locais e ainda por cima passar na prova.
Agora ele pode tomar o lugar dum conterrâneo nosso sem nem mesmo sair do ar-condicionado onda já habita. A cada dia a coisa vai ficando mais fácil. A gente só precisa descobrir exatamente pra quem.
Acho que eu devia pedir uma compensação, uma indenização por todo o estudo e esforço que agora não existe mais. É injusto que eu, e provavelmente você, tenha ralado tanto e os outros peguem tudo de mão beijada. Se não agora, na próxima bobagem que fizerem com o vestibular.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Pobreza

Tava outro dia num bar, quando um dos garotos da mesa ao lado falou:
- Eu queria ser pobre um dia...
Imediatamente o outro respondeu – Mas você não vive dizendo que é pobre??
- Sim, queria ser pobre um dia! Ser pobre todo dia é foda!!!
Depois dessa interessante observação, comecei a prestar atenção à conversa deles. Não variava muito: futebol, mulheres (sempre depreciativos), baladas. Nada muito interessante.
Não os ouvi falarem uma vez sequer sobre livros lidos, a economia mundial, as próximas eleições, nada que fosse minimamente cultural.
Diante disso, eu fiquei pensando que o sujeito, e os amigos dele, realmente é pobre. Não pobres no sentido estrito de desprovidos de dinheiro, até porque todos eles tinham carros novos.
Mas no sentido de falta de espírito. Taí o Aurélião que não me deixa mentir: pobreza é a “falta do necessário à vida (...)”. Mas afinal, o que é necessário à vida? Se você perguntar para um biólogo, um nutricionista, ou um médico, eles provavelmente discorrerão sobre alimentos, proteínas, essas coisas que você, assim como eu, não entende nada. Já um economista ou alguém que trabalha nesse setor te mostrará, como nos mostram todas as noites no Jornal Nacional, um monte de tabelas, números e índices, que a gente também não entende.
Para o trabalhador comum a definição de pobreza é mais simples, e dessa vez você com certeza iria entender: falta de dinheiro. No caso de um sujeito de classe media, falta de dinheiro pra passear de vez em quando, pra fazer uma viagem nas férias ou pra trocar de carro às vezes. Para alguém de classe mais baixa, não ter dinheiro pra por comida no prato dos filhos toda noite...
Só que para um pretenso escritor como eu, pobreza é muito mais do que falta de dinheiro. Pelo menos na minha modesta (e talvez medíocre) concepção, a “falta do necessário à vida” vai bem mais além da ideologia pequeno burguesa dos bens materiais. Necessário à vida é também o acesso à cultura. Mais do que simples acesso, interesse.
Já falei antes sobre transformarem o funk em “cultura nacional”. Pois é assim que a gente tem visto ser tratada a nossa cultura. Tem sido chamado de regionalismo erros grosseiros de português, como “crínica” ou “quato”. Isso não é regionalismo. É burrice mesmo!
É cada vez mais raro você encontrar alunos que tenham lido a bibliografia recomendada por um professor. Se leram alguma coisa foi o resumo publicado na internet. Ou pior ainda, está cada vez mais difícil encontrar um professor que tenha uma bibliografia pra recomendar!
Mas o pior é que isso é só uma causa. E se a Lei de Newton estiver certa e para cada ação existir uma reação, as conseqüências dessa falta de cultura no Brasil são a violência e a criminalidade. Não exige muito raciocinar que o principal motivo para a crescente onda de violência reside na mente vazia de jovens, que, sem opção de estudo, partem para a criminalidade.
Principalmente quando esse jovem vê que pra conseguir um castelo não adianta estudar. O negocio é mesmo roubar. E nem isso o infeliz aprendeu direito, porque o dono do castelo talvez perca seu lugar no Congresso. Mas o ladrãozinho vai pra cadeia mesmo.
Podem falar o que quiserem, que o mundo não dá mais tempo para a leitura, que hoje o importante é saber só sobre o trabalho que desenvolve, que o cara chega cansado em casa e não tem tempo pra ajudar o filho num dever da escola. Isso pra mim é balela.
Já vi muitas mães chegarem em casa cansadas, estressadas e ainda assim foram ajudar o filho na tarefa de casa. Também já vi pessoas que trabalham oito, nove horas por dia, passam mais três horas pelo menos num ônibus lotado e ainda tem tempo pra ler, nem que seja no banheiro. Quando eu trabalhava numa livraria, meu chefe falou que se você quer muito ler um livro, você precisa ter pelo menos ter cópias: uma pra andar com você, uma pra ficar na sua casa e uma pra ficar no seu banheiro!
Posso estar superestimando o poder da leitura, e subestimando a capacidade de leitura das pessoas à minha volta, mas cada vez que vejo uma pessoa falar que tem um “pobrema” eu tenho uma súbita contorção, como se fosse desmaiar.
Talvez o Brasil seja a terra do “tudo se ajeita”. É difícil ver uma grande comoção social, ou algum grande protesto. O último que eu vi foi pra tentar desencalhar um monte de mulher sem namorado! Talvez o Brasil acabe por ser mesmo um país pacifico, onde tentamos arrumar tudo na base da conversa e do jeitinho. E que se não arrumar, “piorar não vai mesmo!”
Mas suspeito que essa apatia da população tenha menos a ver com um espírito indolente e pacifista do que com uma crônica falta de saber, cuidadosamente estruturada pelos barões, agora congressistas, para que o voto de cabresto ainda valha. E continuamos a vestir esse cabresto de rendas douradas chamado “redução do analfabetismo” e “aumento das vagas na faculdade”.
Sei não, posso até estar errado, mas o Brasil não é pobre em inteligência. Muito pelo contrário, tem inteligência de mais. Só está nas mãos erradas...

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Ceia de Natal

Maria Rosa desceu a rua. Uma bela mulata com a cesta de compras. Vai pra casa preparar a ceia de Natal do seu homem. Nem mesmo podia chamar de seu, afinal não eram casados. Ele havia se casado antes, mas se desquitara. Nunca revelara o motivo e ela nunca perguntara.
Era véspera de Natal e Maria Rosa se lembrou do presente do Alvarez, comprado uns dias antes. Um relógio de prata, importado, muito bem acabado. Combinava com ele, era sóbrio e elegante, assim como o Alvarez, ou pelo menos are assim que pensava Maria Rosa. Ela às vezes imaginava como é que tinha conquistado aquele homem alto, bonito, elegante, charmoso e culto.
Havia descoberto que era muito mais caro do que seu parco orçamento poderia comprar, mas mesmo assim levou-o. Decididamente, combinava com o Alvarez. Com esses pensamento à lhe indicar o caminho, segui para casa, fazer o jantar.
O Alvarez já havia avisado que iria demorar, já que tinha trocado o turno com um colega que precisava ver a família. Era um amigo dos amigos, e Maria Rosa admirava-o por isso.
Nove e meia da noite, o peru no forno, Maria Rosa atende ao telefone: o amigo com quem o Alvarez trocara de turno ligara para desejar Feliz Natal. Pergunta por Alvarez. Maria Rosa lhe responde que ainda não chegou do serviço
- Mas só o segurança trabalha hoje. Tudo parado por causa do Natal!
O fone cai no chão. Ao recolocá-lo no gancho, ainda em choque, ele toque quase que instantaneamente. Maria Rosa, como se o telefone fosse algum animal peçonhento. O instinto, entretanto, lhe diz para atender. É o Alvarez.
Com a habilidade de uma atriz consumada, Maria Rosa aceita a desculpa de Alvarez para o atraso.
- Não demora mais nada, amor! Já chego.
Então Maria Rosa se lembra de ter visto, quando voltava pra casa com as compras, um carro parecido com o do Alvarez. Um carro popular, como muitos por aí, mas alguns detalhes semelhantes haviam chamado sua atenção. Não imaginara que podia ser mesmo o dele.
Ela volta ao local aonde vira o carro. Ainda está estacionado. Uma olhada mais de perto lha diz que é mesmo o carro do Alvarez. Ela olha ao redor, tentando adivinhar onde estará ele. Súbito, uma risada ecoa de um dos prédios próximos até a rua. Mesmo sem os anos de convívio, aquela risada seria inconfundível. E veio de um bordel.
Maria Rosa se aproxima da janela. A iluminação em tons de vermelho dificulta a visão, o lugar está quase vazio. È véspera de Natal. Pela janela Maria Rosa vê Alvarez, sentado, numa roda de amigos desconhecidos dela, e com uma mulher, branca, grande, ao colo. Cada coxa da mulher daria as duas de Maria Rosa. A mulher é muito mais alta. Esta quase nua, uns trapos apenas cobrem suas partes intimas e as mãos de Alvarez, que tentam arrancar as já parcas roupas da mulher. Ela parece nem se importar. E então, Alvarez vê Maria Rosa pela janela.
Ela foge, ela vai atrás. O carro demora a pegar. Quando Alvarez chega ao apartamento, a porta esta trancada. Ele bate, esmurra a porta, mas nada. Durante algumas horas ele argumenta em vão com um pedaço de madeira. Não fosse por alguns soluços sentidos que ouvira quando chegou, Alvarez diria que a mulata nem estava em casa.
Então ele percebe um cheiro estranho e diferente. Adocicado. Aquilo lhe aperta a garganta. Alvarez arromba a porta do apartamento. Vai à cozinha. O peru, ainda cru, em cima do fogão. No chão, com a cabeça dentro do forno, Maria Rosa. Ele tenta reanimá-la. Em vão. O gás arruinara seus pulmões irremediavelmente. Ela se suicidara de desgosto e mágoa.
O primeiro pensamento de Alvarez era o de seguir-lhe os passos. Mas falta-lhe coragem. Todas as grandezas e qualidades que Maria Rosa tanto apreciava, inclusive a coragem e a nobreza, não passavam de um embuste.
E na noite de Natal, Alvarez iria se consolar nos braços da grande alemã do prostíbulo de Madame Dolores.

(in) Segurança...

Mais uma vez, vejo com tristeza as reportagens sobre a Segurança Pública brasileira, principalmente quando se trata da situação do Sistema Prisional. É muito fácil para as pessoas julgarem o trabalho de outros, sem estar em seu lugar.
O trabalho do Agente Prisional é muito mais complexo e rigoroso do que se pensa. Trabalhando sem estrutura, segurança ou equipagem, o Agente tem de enfrentar os mais perigosos criminosos, todos confinados num espaço exíguo, e com as mais suspeitas disposições.
Em qualquer lugar do mundo, mesmo nos manuais de segurança distribuídos nos supostos cursos de formação, um procedimento seguro, num ambiente prisional, comportaria de 7 à 20 reeducandos para cada Agente de segurança. Destes, ao menos um terço com algum tipo de armamento, que fosse não letal.
Numa penitenciária como a Penitenciária Central do Estado (antigo Pascoal Ramos), os cerca de 1400 presos são “controlados” por 15 Agentes, ou menos. Sei que não entendo muito de matemática, mas com certeza essa conta ta meio desproporcional!
Não bastasse o déficit de pessoal, falta de treinamento complica ainda mais esse quadro. Quando entram no sistema, os Agentes novatos recebem instrução, o mais das vezes meramente teórica, durante um mês. Só para comparação, no estado de Mato Grosso, o treinamento da Polícia Civil dura cerca de seis meses. Da Polícia Militar, oito. Isso quando têm esse treinamento. Alguns dos Agentes, sob a alegação de exigência imediata de pessoal, são colocados imediatamente no serviço, tendo de aprender seu mister graças à sua própria disposição e ao apoio dos colegas.
Quanto à remuneração nem se fala. Quero deixar claro que não são só os Agentes que ganham pouco, mas toda a classe da segurança pública. Um policial militar, em inicio de carreira, não ganha mais do que 800,00 reais. Um policial civil, cargo para o qual hoje se exige nível superior, cerca de 1400,00 reais. O problema é que em ambos os casos, as tentações não são tão grandes.
Numa penitenciária com mais de mil homens confinados, diuturnamente os Agentes recebem propostas, das mais variadas. Desde coisas inocentes, como comprar um cigarro ou levar uma carta para a família, até coisas mais complexas, tipo celulares e drogas. Uma pessoa que ganha bruto cerca de 1000,00 reais tem de ter muita força de vontade para não se corromper, sabendo que pode ganhar pelo menos a metade disso num único dia. Infelizmente, alguns deles se vendem. Mas são minoria.
Por mais incrível que pareça, o convívio com os presos torna os Agentes avessos à muito contato com eles. Isso, somado ao medo de uma possível punição, faz com que apenas alguns se corrompam. É improvável que, num ambiente como esse, todos sejam honestos e direitos. E corruptos existem em todos os lugares, Brasília que o diga.
Agora verdade seja dita: falta de treino, de estrutura, de dinheiro, isso os Agentes tiram de letra. Difícil mesmo é conviver com a insegurança. A cada plantão, ao entrar no presídio, o Agente pensa que aquele pode ser seu último dia vivo. Nenhum lugar é mais imprevisível do que uma unidade prisional. A qualquer momento um preso pode se desentender com outro e a briga se generaliza. Acertos de contas, vinganças, rixas de gangues ou mesmo o descumprimento das severas leis internas dos presos, podem desencadear uma rebelião. E nesse momento, os Agentes se encontram na pior de todas as condições, a de refém.
Só quem passou por isso pode dizer como é. Não existem palavras ou imagens que possam dar a dimensão do terror que é estar em poder daqueles que desprezam você, sua função e sua instituição. Num momento como esse, qualquer movimento ou palavra pode acabar com a sua vida. A raiva dos presos pode vir também de justamente o Agente ter sido um funcionário correto e exemplar. Sua recusa em fazer favores aos presos pode ser sua sentença de morte.
Como se não bastasse a insegurança física, há também a insegurança psicológica. Ser um bom funcionário não é, como em todo lugar normal, um motivo para sua promoção. Pelo contrario, chefes colocados em sua posição por interesses políticos ou por falta de alguém mais competente, se sentem sempre ameaçados por qualquer funcionário que demonstre o mínimo vestígio de competência ou iniciativa.
Os acertos, mesmo aqueles que estão além de suas funções e obrigações, não são valorizados. Os erros, por menores que sejam diante das inúmeras vicissitudes por que passam, são severamente punidos. Não existe a chance do segundo erro, no primeiro não só é punido. É crucificado.
Com todos esses problemas, ainda enfrentam uma opinião pública implacável. À menor suspeita de maus tratos contra os indefesos e inocentes reeducandos, os Agentes são obrigados à enfrentar comissões das Igrejas, da OAB, Promotores de (in)Justiça e uma mídia que não quer saber da verdade, mas de audiência.
A única coisa que eu pergunto é: alguma dessas entidades foi até a casa de algum Agente que foi refém para saber como ele está, se precisa de apoio, ou como foram as surras, tomadas dos “ingênuos” reeducandos? Que eu saiba, não. Por favor, por favor mesmo! me corrijam se eu estiver errado.
Sem apoio, sem dinheiro, sem estrutura, sem treinamento, sem segurança, sem nada. Mesmo diante de todos os problemas, os Agentes trabalham com afinco, sem se deixar levar pela mídia ou por maledicências. Como é que a gente tem certeza de que eles são tão esforçados assim? É só você perceber que existem mais presos dentro das celas do que foragidos. Ou ainda, perceber que ainda existem cadeias!
Então, da próxima vez que você quiser criticar um Agente, ou mesmo um policial, tente fazer o trabalho dele, nem que seja só por um dia! Tente passar o dia todo abrindo grades de celas, ou tentando impedir assaltos. Se você fizer isso, daí sim você vai ter direito de criticar. Antes disso, o que você falar, pra mim, não passa de retórica vazia.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Funk e Cultura não se misturam

Noutro dia estava ouvindo rádio, quando um dos locutores comentou que odiava funk. Imediatamente seu companheiro lhe respondeu que funk também faz parte da cultura nacional.
- Então estamos mal de cultura, hein! – foi a resposta do primeiro.
E devo confessar que concordo com ele. É difícil pensar que uma música na qual as mulheres são chamadas de cachorras e “tchutchucas” e que ensinam os garotos a chegar em uma menina e perguntar: “e aí, gata, já é ou já foi?” ao invés de fazer algo romântico, como beijar a sua mão e abrir uma porta de carro, seja considerado como cultura.
Taí a definição de cultura: “Sistema de idéias, conhecimentos, técnicas e artefatos, de padrões de comportamento e atitudes que caracteriza uma determinada sociedade”. Sempre achei esse conceito meio abstrato e vago pra definir a cultura brasileira, já que existe uma imensa variedade de microssociedades dentro do território brasileiro.
O tamanho continental do Brasil torna quase impossível que seja feita uma definição clara e objetiva da cultura. É preciso fazer um grande apanhado e integrar as várias representações regionais da cultura.
Mas definitivamente, o funk não se integra à esse apanhado. Mesmo coisas estranhas e surpreendentes, tais como forro à la Calypso e a música brega, queira ou não (e devo confessar que, pessoalmente, não queria) fazem parte dessa mistura de gostos e representações culturais.
Isso porque, de alguma forma, isso realmente representa o que as suas regiões vêem como vida e sociedade. Mas se o funk representar verdadeiramente a nova sociedade brasileira, então estamos ferrados. Ate porque a única coisa que o funk ensina é como humilhar e reduzir à uma condição de inferioridade as pessoas ali retratadas. Mulheres são objetos e homens são trasgos desalmados.
Nunca gostei muito do programa Zorra Total, da Globo, mas havia um quadro, das funkeiras, que eu adorava! Uma siticom simples e clara, que mostrava como o funk oblitera a razão e transforma as pessoas em seres ignorantes.
Pra quem não sabe, o funk surgiu nos Estados Unidos, como uma forma dos negros expressarem sua indignação com a condição de inferioridade perante a sociedade branco-racista (isso sim é cultura). Mas entre outras coisas, o funk original americano tem letra! Nesse funk que tomou conta do Brasil, qualquer palavra com mais de três sílabas é descartada, sob a alegação de que não rima com o resto da letra (tem isso lá?). Mas a verdade é que a maioria dos “letristas” de funk não consegue soletrar palavras mais complexas.
Vamos deixar claro aqui que não estou criticando quem gosta de funk! Como dizia meu finado avô: “O que é do gosto, é regalo da vida!”. Tem gosto pra tudo, tem gente que gosta de funk, tem gente que não gosta de música, tem gente até que torce pro Corinthians!
O problema é tentar transformar o funk, esta anomalia musical, em cultura e dizer que isso seja cultura. O dia que isso for verdade, vou poder dizer que Machado de Assis era um velho decrépito e que eu sou o expoente da literatura nacional!!! O mundo (ou pelo menos o Brasil) vai estar definitivamente encrencado.

Mendigos

Uma praça no centro da cidade. Um homem distinto, grisalho, rosto algo sério, está caminhando, voltando para o trabalho depois de seu almoço.
Nisso, lhe chama a atenção um homem, ou melhor, um trapo humano. Sujo até o ultimo fio de cabelo, todo roto e esfarrapado, um molambo.
Quando se aproxima o senhor, o mendigo pede:
- Dá um trocado moço?
- Ta me achando com cara de banco?
- Ô moço, seu o senhor soubesse o que eu tenho passado...
Mais por curiosidade do que por espírito de piedade que o homem se aproxima.
- Faz mais de três meses que tô desempregado, sem um tostão furado no bolso. A mulher me abandonou! Fugiu com um ambulante, vê só, um ambulante!! E ainda por cima, me larga os filhos pra criar.
- Quanta tristeza! E como você faz pra viver?
- Três filhos, Doutor!! Três! A gente vai trabalhando, fazendo uns biscates, pedindo um trocado, fica tudo aqui na bolsa, o dinheiro ganho no dia fica aqui – se lamenta o mendigo, apontando uma bolsa de napa surrada ao seu lado. – No outro dia de manhã, a bolsa já ta vazia de novo!
De repente, num tropel de homens, armas e barracas desmontadas às pressas, surge o “rapa” da polícia. Homens fardados, determinados à banir das ruas, mendigos, moleques e camelôs. O mendigo maltrapilho sai correndo, largando tudo e todos, fugindo da fúria estatal.
Depois de quase apanhar, confundido com um ambulante (logo um ambulante!), o homem olha para baixo e percebe que, na pressa, o mendigo esquecera sua sacola. Ele a recolhe, pensando se vai poder devolvê-la no dia seguinte. Quando abre, à primeira vista, parece que há muito dinheiro na sacola, mas o homem percebe que são só moedas de pequeno valor. Não pensa mais nisso.
No outro dia, ele leva a sacola pensando se o mendigo estaria lá. Não estava. Passam os dias e nada do mendigo. A sacola fica esquecida numa gaveta da mesa, no escritório.
Passado algum tempo, o homem descobre que esqueceu a carteira em casa e não pode pagar o almoço. Ele se lembra da sacola do mendigo, escondida no fundo duma gaveta. Não é roubo, é só um empréstimo. Ele vai repor tudo quando encontrar o mendigo (se encontrar). Ele tira o dinheiro da sacola e começa a contar. É muito dinheiro, muito mesmo! Mais do que o homem ganharia em quinze dias. E, segundo o mendigo, ele tinha ganho aquilo só numa manhã. Difícil acreditar.

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Dias depois, o mendigo volta para o seu canto na esquina. O lugar ficou cheio de guardas depois daquele dia em que teve que sair correndo. Até mesmo perdeu a bolsa de dinheiro. Além de tudo, nem pode mendigar no seu ponto mais lucrativo.
Quando ele chega perto do lugar, surpresa: tem outro mendigo ali. Tão maltrapilho quanto ele, mas ainda mais sujo. Veste os restos de um paletó esfarrapado. Ao chegar mais perto ele percebe que conhece o homem. Vasculha a memória e se lembra: é o sujeito que conversava com ele quando o rapa chegou.
- Oh doutor, que você ta fazendo?
- Cala a boca, mendigo! Que doutor o que! – e mais baixo – Fica quieto, se eles descobrem, eu to ferrado.
- Mas o que aconteceu? – diz o outro, aos sussurros
- Depois que você foi embora correndo, eu vi a sua bolsa. É dinheiro pra caramba que você ganha aqui, hein! Depois disso, resolvi virar mendigo também. Larguei o emprego e to ganhando bem mais aqui.
- Mas e eu?? Esse é o meu ponto!
- Se vira! Você que abandonou o lugar.
- Se você não sair, eu conto pra todo mundo que o senhor é doutor e tem emprego em empresa bacana.
O outro fica pensativo. Depois decide:
- A gente faz o seguinte: de manhã um, de tarde outro. Quem não tiver pedindo, fica de vigia pra rapa não pegar.
- Certo, combinado. Eu fico de tarde
- Tá bom.
O que os dois não percebem é que tem um outro homem atrás deles, atraído pela discussão e tentando ajudar os dois. Depois de ouvir tudo aquilo, ele reflete melhor e decide que eles não precisam de ajuda coisa nenhuma.
No dia seguinte, do outro lado da praça, tem um mendigo a mais pedindo esmola!

Instintos

Deus, em sua imensa sabedoria, criou o homem a sua imagem e semelhança. Se o que diz a Bíblia for verdade, Deus tem problemas sérios. Principalmente quando se trata de instintos e vontades.
Quem nunca teve aquele instinto assassino de comer, aquela fome arrasadora que, como diria Luiz Fernando Veríssimo, arranca a patina de civilidade de nós e nos reverte ao primata canibal?! Tudo bem, não precisamos ser tão dramáticos, mas que às vezes temos aquela fome inacreditável, isso lá é verdade.
Outra vontade que as vezes temos é de ir ao banheiro. Não é simplesmente uma vontade de fazer xixi. Eu estou falando daquela vontade louca de defecar, na verdade, de cagar mesmo. Que atire o primeiro rolo de papel higiênico quem nunca passou por isso.
De repente, você sente aquele embrulho no estomago, como se tivessem judeus e palestinos lutando lá dentro. Depois desce um frio pela espinha, daqueles que fazem ate você ter um tremelique. A próxima etapa são os arrepios. Simplesmente todos os pelos do seu braço ganham vida e resolvem levar, praticamente fazendo uma parada militar ao longo do seu antebraço. Por fim, o suor, escorrendo pela sua testa. Pode estar fazendo menos dez graus lá fora, mas mesmo assim você esta suando.
As outras pessoas começam a achar que você esta passando mal, tendo um ataque de febre, entrando em surto psicótico. Na verdade, você esta entrando em surto. Você começa a olhar para os lados, a procura de um banheiro, uma latrina, meu Deus, uma lata de lixo! Nessas horas os homens se dividem em dois tipos: os que fazem suas necessidades onde puderem, seja lá o estado em que esteja o banheiro, e se estiverem na fazenda ou no meio da estrada vão fazer é no mato mesmo e olha o pé de urtiga, e daqueles que preferem lugares mais higiênicos.
Obviamente, os do segundo tipo sofrem mais porque tem horror a banheiros públicos, ou na verdade, qualquer lugar que não seja o banheiro da sua própria casa. Devo confessar que sou do segundo tipo. Quando estou viajando é uma coisa horrível. Nem mesmo posso me regalar com quaisquer iguarias que sejam servidas em jantares ou almoços, vai que me da a vontade louca de cagar, não tem lugar e ai que inferno. Imagine você dentro duma casa trancada com ela pegando fogo. É mais ou menos assim que a gente se sente quando precisa ir desesperadamente ao banheiro mas não consegue. Abençoados sejam aqueles que conseguem defecar em qualquer lugar.
Agora o pior de todos os instintos é o sexual. Sabe aquela gata do departamento ou aquele vizinho moreno e sarado? Aquele tipo de pessoa que você olha e deseja ardentemente ir pra cama com ela? Pois é, nos fomos ensinados que isso é pecado, que devemos levar uma vida monástica, se possível, celibatária. O numero de casos de adultério (que graças a Deus deixou de ser crime) e de mães solteiras prova que a gente não dá conta de fazer isso. Mas a gente tenta, tenta de verdade.
Voltando a gostosa do departamento, nosso primeiro instinto é ir lá e deixar claro que queremos transar com ela naquele momento, de preferência em cima da maquina copiadora. Mas é claro que anos de doutrina não se perdem tão facilmente e não fazemos isso. Muito pelo contrario, soterramos nossos desejos sob tantas camadas de educação e respeitabilidade, que quase nos esquecemos de nossa origem primata.
Agora o pior é quando finalmente realizamos nosso desejo de comer aquela mulher (ou aquele homem, ou o que for, afinal não temos preconceitos), e vamos pra cama. Acho que enfim conquistar a mulher dos seus sonhos seja igual conseguir escalar o Monte Everest: você fica sem fôlego, acha que esta no momento mais sublime de sua vida medíocre, mas também esta brocha, sem saber o que fazer e pensando lá no fundo que aquilo não era nada disso que você estava pensando. Afinal, depois de tanto tempo batalhando pela pessoa dos seus sonhos, você fica tão embasbacado por finalmente ter conseguido, que perde a memória e não sabe mais como transar. Tenta tirar a cueca e só depois percebe que ainda não tirou as calcas. Não sabe onde colocar o pinto e por fim, se não brocha, tem ejaculação precoce. E o pior é que sem maquiagem, aquelas roupas elegantes (ou mais provavelmente provocantes) e tudo mais que ela põe por cima de si mesma, você descobre que ela nem era tão gostosa assim. E se for, não sabe transar direito. É foda, quer dizer, não é foda e esse é o problema.
Enfim, o negocio é arriscar mesmo, cagar no mato e cantar a mulherada sem medo, afinal o máximo que pode acontecer é você levar um fora ou ficar com a bunda ardida por causa das urtigas!

Gerações

Não sei você, mas acho difícil não se admirar coma geração dos anos 70. Era uma geração muito mais unida, mais corajosa, incomparavelmente mais desprendida, enfim, mais livre.
Por causa dessa geração, por causa daqueles jovens é que temos hoje as nossas pretensas liberdades. Para a geração woodstokiana bastava uma mochila nas costas, uma calça jeans e um par de tênis. Ia-se a qualquer lugar, a qualquer hora. E no final das contas, enfrentaram todo o poderio do governo americano para impedir o massacre deles mesmos numa guerra insensata e despropositada.
A geração anos 70 brasileira foi um pouco mais rebelde. Simplesmente lutou contra a tirania de um estado repressor, durante uma quase-guerra civil, insurgindo-se contra a Ditadura Militar. Presos, torturados e humilhados, mesmo assim eles resistiam bravamente.
Sei não, mas não consigo ver a juventude de hoje em dia fazendo isso. Ate porque, nos porões da ditadura não se pode entrar com celular nem acessar o orkut. Imagine a desgraça! A geração atual simplesmente não é capaz de sobreviver sem as maravilhas tecnológicas, e por causa disso, vive alienada na frente de um computador.
Vi a alguns dias uma tirinha mostrando um rapaz à frente de um computador, onde se via a mensagem de vários amigos virtuais, mas com a legenda de vários meses sem transar.
Se você perguntar hoje para um adolescente algo sobre a política governamental ou a diferença entre um senador e um deputado, é provável que ele não saiba. Mas se você perguntar qual a onda do momento, ou a moda da estação, você se verá surpreendido por um dilúvio, não só de explicações, mas também de comentários acirrados sobre o assunto e a indignação por você ser tão obtuso que não sabe como se vestir!
A ultima grande mobilização da juventude brasileira foram os caras-pintadas, isso no começo dos anos 90. Aqueles jovens, hoje são os dignos pais da atual geração de jovens, que por sua vez nem mesmo sabe o que aconteceu naqueles dias.
Não sei se é falta de cultura ou de compreensão política de mundo, mas a juventude brasileira anda se degringolando numa casta alienada, violenta e obtusa, que acha bonito e certo espancar uma mulher num ponto de ônibus e depois ainda se desculpa dizendo ter achado que ela era uma prostituta, como se isso diminuísse a sua culpa ou atenuasse seu ato.
Sei que essa culpa é, ao menos em parte dos pais, que se preocuparam tanto em trabalhar para dar conforto material para seus filhos, que se esqueceram em educá-los. Mas também é do governo, que simplesmente abdica do seu dever de educar e preparar os jovens, para que eles não possam pensar e, porventura, tirar os caciques mumificados que habitam as altas esferas do poder, e da TV, que preocupa mais em vender produtos e ideologias do que em ensinar algo útil às crianças e adolescentes.
Tudo bem arrumar culpados e responsáveis é fácil. Difícil é arranjar soluções. Mas ai vai uma sugestão: ao invés de se matar de trabalhar, por que os pais, quando chegarem em casa, não convidem os seus filhos pra assistir o jornal com eles. E quando seus filhos te fizerem uma pergunta, não respondam: “não enche o saco, moleque!”, mas expliquem o que ele não sabe. E se você não souber, não tenha medo de admitir isso, ninguém é tão perfeito que saiba tudo.
Se vocês estão achando que eu vou dar conselhos para as TVs e para os políticos, podem tirar o cavalinho da chuva, eu posso até ser burro, mas não sou louco. Até porque ninguém de Brasília vai ouvir mesmo. O povo que pensa, não vota em quem não presta. Se o governo ensinar o povo a pensar, quem é que vai votar neles?
Sei que tudo o que falei pode parecer inócuo e tolo diante dos enormes problemas por que passa o país, mas é só a gente se lembrar da historia do beija-flor na floresta, onde um beija-flor sozinho tenta apagar o incêndio enquanto todos os outros fogem. Quando falam pra ele que sozinho ele jamais vai conseguir aquela proeza, ele responde: “Se todo mundo fizer a sua parte, a gente consegue. E alguém precisa começar o trabalho!”
Pensando bem, a gente consegue sim! É só avisar todo mundo dessas mudanças. Então deixa eu entrar no meu msn e mandar uns recados no orkut!