quarta-feira, 20 de maio de 2009

Pobreza

Tava outro dia num bar, quando um dos garotos da mesa ao lado falou:
- Eu queria ser pobre um dia...
Imediatamente o outro respondeu – Mas você não vive dizendo que é pobre??
- Sim, queria ser pobre um dia! Ser pobre todo dia é foda!!!
Depois dessa interessante observação, comecei a prestar atenção à conversa deles. Não variava muito: futebol, mulheres (sempre depreciativos), baladas. Nada muito interessante.
Não os ouvi falarem uma vez sequer sobre livros lidos, a economia mundial, as próximas eleições, nada que fosse minimamente cultural.
Diante disso, eu fiquei pensando que o sujeito, e os amigos dele, realmente é pobre. Não pobres no sentido estrito de desprovidos de dinheiro, até porque todos eles tinham carros novos.
Mas no sentido de falta de espírito. Taí o Aurélião que não me deixa mentir: pobreza é a “falta do necessário à vida (...)”. Mas afinal, o que é necessário à vida? Se você perguntar para um biólogo, um nutricionista, ou um médico, eles provavelmente discorrerão sobre alimentos, proteínas, essas coisas que você, assim como eu, não entende nada. Já um economista ou alguém que trabalha nesse setor te mostrará, como nos mostram todas as noites no Jornal Nacional, um monte de tabelas, números e índices, que a gente também não entende.
Para o trabalhador comum a definição de pobreza é mais simples, e dessa vez você com certeza iria entender: falta de dinheiro. No caso de um sujeito de classe media, falta de dinheiro pra passear de vez em quando, pra fazer uma viagem nas férias ou pra trocar de carro às vezes. Para alguém de classe mais baixa, não ter dinheiro pra por comida no prato dos filhos toda noite...
Só que para um pretenso escritor como eu, pobreza é muito mais do que falta de dinheiro. Pelo menos na minha modesta (e talvez medíocre) concepção, a “falta do necessário à vida” vai bem mais além da ideologia pequeno burguesa dos bens materiais. Necessário à vida é também o acesso à cultura. Mais do que simples acesso, interesse.
Já falei antes sobre transformarem o funk em “cultura nacional”. Pois é assim que a gente tem visto ser tratada a nossa cultura. Tem sido chamado de regionalismo erros grosseiros de português, como “crínica” ou “quato”. Isso não é regionalismo. É burrice mesmo!
É cada vez mais raro você encontrar alunos que tenham lido a bibliografia recomendada por um professor. Se leram alguma coisa foi o resumo publicado na internet. Ou pior ainda, está cada vez mais difícil encontrar um professor que tenha uma bibliografia pra recomendar!
Mas o pior é que isso é só uma causa. E se a Lei de Newton estiver certa e para cada ação existir uma reação, as conseqüências dessa falta de cultura no Brasil são a violência e a criminalidade. Não exige muito raciocinar que o principal motivo para a crescente onda de violência reside na mente vazia de jovens, que, sem opção de estudo, partem para a criminalidade.
Principalmente quando esse jovem vê que pra conseguir um castelo não adianta estudar. O negocio é mesmo roubar. E nem isso o infeliz aprendeu direito, porque o dono do castelo talvez perca seu lugar no Congresso. Mas o ladrãozinho vai pra cadeia mesmo.
Podem falar o que quiserem, que o mundo não dá mais tempo para a leitura, que hoje o importante é saber só sobre o trabalho que desenvolve, que o cara chega cansado em casa e não tem tempo pra ajudar o filho num dever da escola. Isso pra mim é balela.
Já vi muitas mães chegarem em casa cansadas, estressadas e ainda assim foram ajudar o filho na tarefa de casa. Também já vi pessoas que trabalham oito, nove horas por dia, passam mais três horas pelo menos num ônibus lotado e ainda tem tempo pra ler, nem que seja no banheiro. Quando eu trabalhava numa livraria, meu chefe falou que se você quer muito ler um livro, você precisa ter pelo menos ter cópias: uma pra andar com você, uma pra ficar na sua casa e uma pra ficar no seu banheiro!
Posso estar superestimando o poder da leitura, e subestimando a capacidade de leitura das pessoas à minha volta, mas cada vez que vejo uma pessoa falar que tem um “pobrema” eu tenho uma súbita contorção, como se fosse desmaiar.
Talvez o Brasil seja a terra do “tudo se ajeita”. É difícil ver uma grande comoção social, ou algum grande protesto. O último que eu vi foi pra tentar desencalhar um monte de mulher sem namorado! Talvez o Brasil acabe por ser mesmo um país pacifico, onde tentamos arrumar tudo na base da conversa e do jeitinho. E que se não arrumar, “piorar não vai mesmo!”
Mas suspeito que essa apatia da população tenha menos a ver com um espírito indolente e pacifista do que com uma crônica falta de saber, cuidadosamente estruturada pelos barões, agora congressistas, para que o voto de cabresto ainda valha. E continuamos a vestir esse cabresto de rendas douradas chamado “redução do analfabetismo” e “aumento das vagas na faculdade”.
Sei não, posso até estar errado, mas o Brasil não é pobre em inteligência. Muito pelo contrário, tem inteligência de mais. Só está nas mãos erradas...

Um comentário:

  1. Uau.. Realmente, Fe. È mto facil confundir falta de tempo com má vontade, falta de paciencia ou prequisa mesmo. E disfarçar o analfabetismo funcional utilizando estatisticas q provam q não sei quantos % da população é alfabetizada. Se formos considerar alfabetizado aquele q escreve o proprio nome eu ate entendo, mais todos sabemos q no mundo em que vivemos saber ler e escrever mecanicamente n basta mais.
    Falei e disse!!!

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