sexta-feira, 20 de junho de 2014

Maria com Pena



Na coluna da semana passada, discorri sobre a questão da violência que atualmente paira na sociedade brasileira. No texto, foram apontados vários crimes bárbaros que ultimamente têm sido mostrados nas páginas policiais da imprensa brasileira. Entretanto, mais do que os crimes bárbaros que chocam a sociedade, é importante lembrarmos dos crimes que não aparecem nas crônicas policiais, nem causam mais espanto na sociedade. Um desses crimes é a violência doméstica.
Esta semana foi divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) uma pesquisa que aponta que a taxa de mortalidade de mulheres em decorrência de violência doméstica não diminuiu após a vigência da Lei Maria da Penha. A Lei, que visa proteger as mulheres da violência doméstica, passou a vigorar em setembro de 2006 e trouxe penas mais severas para os condenados por violência doméstica e também instituiu mecanismos de proteção à mulher vítima dessa violência, como afastamento do agressor do lar entre outras.
Mesmo assim, passados sete anos, pouca coisa mudou de fato. A taxa de mortes de mulheres vítimas de violência doméstica passou de 5,18 mortes por grupo de mil mulheres em 2005 para 5,43 mortes em 2011.
Mais do que isso, quais as formas de proteção que o Estado oferece à vítima de violência domestica? Por mais que sejam determinadas judicialmente as chamadas Medidas Protetivas de Urgência, é possível assegurar seu cumprimento? A resposta é: não!
Não porque a polícia não tem efetivo nem estrutura para garantir que um agressor não se aproxime da vítima. Não porque o judiciário e a polícia não têm condições de vigiar o agressor durante as 24 horas do dia para assegurar o cumprimento das medidas determinadas.
Além disso, vale ressaltar outra faceta da violência doméstica: normalmente existe uma dependência entre a vítima e o agressor, seja ela financeira, emocional ou psicológica. Fora a pressão social que é feita sobre a vítima, que manipula a vítima à acreditar que deve manter a unidade familiar.
Essa falta de apoio financeiro e psicológico induz a vítima da violência doméstica a não representar o agressor, reatando os laços domésticos e fazendo com que a situação de violência persista.
Apenas para se ter uma ideia, apenas na comarca de Comodoro, no ano de 2013, foram registrados quase 50 pedidos de medidas protetivas. Boa parte deles foi arquivado à pedido da vítima, que disse ter se reconciliado com o réu.
Claro que não devemos ser totalmente crédulos. Existem casos de denúncias de agressão doméstica falsas, feitas apenas por vingança ou ainda para evitar a perda da condição financeira e social que decorreria do divórcio. Também existem casos de vítimas que se reconciliaram com o agressor simplesmente por aceitarem essa situação. Como dizia a Dona Santinha Pureza da Escolinha do Professor Raimundo: “Eu góstio!
Entretanto, esses são casos pontuais, são exceções. A realidade mais comum é a da vítima que volta ao convívio do agressor pela simples falta de opção. Para esses casos, a Lei Maria da Penha determina que haja o encaminhamento da ofendida à programas de proteção ou atendimento, até  mesmo com o oferecimento de abrigo para que a vítima possa residir até o final do processo.
Outra solução que seria possível, ainda que não prevista na Lei Maria da Penha é a obrigatoriedade do uso de tornozeleiras localizadoras pelos agressores. Com isso, a polícia poderia ser avisada do descumprimento das medidas impostas ao agressor.
Até mesmo obrigar o agressor à pagar pensão alimentícia à vítima ou a concessão de auxílio financeiro do Estado para a ofendida seria uma saída para a dificuldade financeira da vítima.
Mas nada disso tem sido aplicado. Enquanto essas medidas ficam apenas no papel, a violência doméstica vai fazendo mais vítimas. Não apenas nas classes mais baixas, como é a crença popular. Em junho deste ano, a Juíza da Comarca de Alto Taquari foi morta à tiros, dentro do Fórum, por seu ex-marido que tentava reatar o relacionamento. Com a recusa da juíza, o ex-marido deu três tiros na magistrada, que morreu na hora.
Hoje em dia, tanto o Estado quanto a sociedade devem rever seus conceitos, afinal em briga de marido e mulher, alguém deve meter a colher sim!

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