Texto publicado no site Olhar Direto em 16 de março de 2010
Link: http://www.olhardireto.com.br/artigos/exibir.asp?artigo=Selvagem&id=1471
O Luis Fernando Veríssimo tem um texto em que o pai de um universitário chega de surpresa para visitar o filho, que estuda em uma outra cidade. Ao chegar, o pai, machista convicto, tem certeza de já entraria no apartamento do filho, nas palavras do autor, “nadando num mar de peitos e bundas”. Todo dinheiro mandado para o filho é na esperança de que seja construído um harém. Ao invés disso, o filho gasta tudo em livros e materiais de pesquisa. “Mas nem uma empregada bonita, filho?!” diz o pai ao ver a idosa secretária do filho.
É a apologia da frustração. E também é ridículo, porque o que, teoricamente, se espera de um filho universitário é justamente que ele estude e tal, não que ele fique o tempo todo festando e bagunçando. Toda a propaganda feita em cima de um bom garoto cai no momento em que o pai descobre que o filho é justamente o bom garoto, e não o menino-problema que todos esperam e que o pai, intimamente, elogia.
Tomadas as devidas proporções, tenho a impressão de que os turistas que visitam o Mato Grosso pela primeira vez se sentem mais ou menos como esse pai. No imaginário popular dos forasteiros, Mato Grosso é uma selva primitiva, que ainda abriga os maiores segredos de um Brasil selvagem e insondável. Parece haver uma idéia de que ao chegarem se depararão com índios transitando em suas tangas mínimas e índias completamente nuas, com jacarés e onças transitando pra lá e pra cá e com uma sociedade primitiva e sem instrução.
E são surpreendidos da mesma forma que o pai quando chegam aqui e se deparam com uma sociedade formada, evoluída (ou quase) e avançando e não com ocas e uma vila agropastoril com camponeses semi-instruídos. E, definitivamente, sem jibóias como animais de estimação.
Tudo bem que temos problemas de aldeias. A educação é de péssima qualidade, a saúde nem se fala e metade das nossas estradas mais parecem uma trilha no meio do mato. Mas também temos os, digamos, problemas de gente grande: violência, transito caótico, favelas, etc.
Não estou falando isso num tom xenófobo ou preconceituoso. Estou falando com conhecimento de causa. Não foram poucas as vezes que, em conversas com pessoas que nunca vieram no MT, que me perguntaram se era verdade que ao invés de cachorros e gatos, nossos animais de estimação eram onças e outros animais selvagens. Nem se, por acaso, eu conhecia muitos índios. Outro dia mesmo eu estava no aeroporto, que algumas pessoas sequer imaginam que exista, quando chegaram alguns turistas americanos. Claramente assustados com a civilidade do lugar. Certo, certo. O nosso aeroporto não é lá essas coisas, principalmente o desembarque, mas comparando com o que eles claramente esperavam, ele é até bastante evoluído. Provavelmente esperavam algo no estilo dos filmes de Hollywood, com pista de terra batida e tochas servindo como iluminação da pista.
Cheguei mesmo a ouvir um garoto dizendo ao seu pai: “Dad, where are the animals? Here isn´t the Jungle?” (Pai, cadê os animais? Aqui não é a Selva?) Claro que pelo menos o guia turístico não iria decepcioná-lo. Quem visse o sujeito, como todos no aeroporto, achava que ele tinha saído direto de uma savana africana. Só de susto, olhei pra trás, pra me certificar que não tinha um leão (ou uma onça) vindo de algum lugar.
É claro que por motivos que me parecem óbvios, com o Pantanal bem ai e tal, alguns mato-grossenses tem um pouco mais de contato com a vida selvagem. Mas daí a serem selvagens, é outra história.
Por fim, acho que a única coisa realmente selvagem que temos no Mato Grosso é a corrupção política, que avança nos nossos pescoços e arrebenta com a nossa jugular. Mas isso até São Paulo tem.
Link: http://www.olhardireto.com.br/artigos/exibir.asp?artigo=Selvagem&id=1471
O Luis Fernando Veríssimo tem um texto em que o pai de um universitário chega de surpresa para visitar o filho, que estuda em uma outra cidade. Ao chegar, o pai, machista convicto, tem certeza de já entraria no apartamento do filho, nas palavras do autor, “nadando num mar de peitos e bundas”. Todo dinheiro mandado para o filho é na esperança de que seja construído um harém. Ao invés disso, o filho gasta tudo em livros e materiais de pesquisa. “Mas nem uma empregada bonita, filho?!” diz o pai ao ver a idosa secretária do filho.
É a apologia da frustração. E também é ridículo, porque o que, teoricamente, se espera de um filho universitário é justamente que ele estude e tal, não que ele fique o tempo todo festando e bagunçando. Toda a propaganda feita em cima de um bom garoto cai no momento em que o pai descobre que o filho é justamente o bom garoto, e não o menino-problema que todos esperam e que o pai, intimamente, elogia.
Tomadas as devidas proporções, tenho a impressão de que os turistas que visitam o Mato Grosso pela primeira vez se sentem mais ou menos como esse pai. No imaginário popular dos forasteiros, Mato Grosso é uma selva primitiva, que ainda abriga os maiores segredos de um Brasil selvagem e insondável. Parece haver uma idéia de que ao chegarem se depararão com índios transitando em suas tangas mínimas e índias completamente nuas, com jacarés e onças transitando pra lá e pra cá e com uma sociedade primitiva e sem instrução.
E são surpreendidos da mesma forma que o pai quando chegam aqui e se deparam com uma sociedade formada, evoluída (ou quase) e avançando e não com ocas e uma vila agropastoril com camponeses semi-instruídos. E, definitivamente, sem jibóias como animais de estimação.
Tudo bem que temos problemas de aldeias. A educação é de péssima qualidade, a saúde nem se fala e metade das nossas estradas mais parecem uma trilha no meio do mato. Mas também temos os, digamos, problemas de gente grande: violência, transito caótico, favelas, etc.
Não estou falando isso num tom xenófobo ou preconceituoso. Estou falando com conhecimento de causa. Não foram poucas as vezes que, em conversas com pessoas que nunca vieram no MT, que me perguntaram se era verdade que ao invés de cachorros e gatos, nossos animais de estimação eram onças e outros animais selvagens. Nem se, por acaso, eu conhecia muitos índios. Outro dia mesmo eu estava no aeroporto, que algumas pessoas sequer imaginam que exista, quando chegaram alguns turistas americanos. Claramente assustados com a civilidade do lugar. Certo, certo. O nosso aeroporto não é lá essas coisas, principalmente o desembarque, mas comparando com o que eles claramente esperavam, ele é até bastante evoluído. Provavelmente esperavam algo no estilo dos filmes de Hollywood, com pista de terra batida e tochas servindo como iluminação da pista.
Cheguei mesmo a ouvir um garoto dizendo ao seu pai: “Dad, where are the animals? Here isn´t the Jungle?” (Pai, cadê os animais? Aqui não é a Selva?) Claro que pelo menos o guia turístico não iria decepcioná-lo. Quem visse o sujeito, como todos no aeroporto, achava que ele tinha saído direto de uma savana africana. Só de susto, olhei pra trás, pra me certificar que não tinha um leão (ou uma onça) vindo de algum lugar.
É claro que por motivos que me parecem óbvios, com o Pantanal bem ai e tal, alguns mato-grossenses tem um pouco mais de contato com a vida selvagem. Mas daí a serem selvagens, é outra história.
Por fim, acho que a única coisa realmente selvagem que temos no Mato Grosso é a corrupção política, que avança nos nossos pescoços e arrebenta com a nossa jugular. Mas isso até São Paulo tem.